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São Paulo, sexta-feira, 19 de setembro de 2003

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JOSÉ SARNEY

Adeus às armas

Nada mais complicado e difícil do que uma decisão simples, necessária e por todos desejada, que é a de controle e proibição da posse e do porte de armas.
A cada momento nascem argumentos absurdos, sob o manto da emoção e da racionalidade, como o de que proibir armas é dar aos bandidos o monopólio delas. Que os bandidos já andam armados e que as possíveis vítimas ficam indefesas sem elas.
Nada mais falso. A lei não é feita para os bandidos; estes já estão fora da lei. O que se deseja é que não se transformem em bandidos os cidadãos que, com a permissividade das armas, sem querer, acabam virando criminosos.
As estatísticas mostram que 75% dos crimes de homicídio são cometidos por porte ocasional de armas de fogo, que não seriam cometidos se a pessoa não estivesse armada. O mesmo valor se repete noutra estatística: 75% das vítimas e autores de homicídio estão na faixa etária entre 18 e 25 anos. Os moços estão matando e morrendo.
Para enfrentar a necessidade de instrumentos legais capazes de interferir nesse processo, mais de 60 projetos de lei estão em tramitação na Câmara e no Senado, tratando do assunto. Para encontrar uma solução rápida, que respondesse à urgência do problema, Câmara e Senado se reuniram em uma comissão conjunta para consolidar todas as iniciativas em andamento e fazer um substitutivo que atendesse às demandas da sociedade.
O mês de julho, do recesso, foi ocupado nesse trabalho. Saiu uma decisão final, com aplausos gerais e apoio da sociedade.
Três meses já se passaram e não aconteceu nada. O acordo foi rompido e setores da Câmara fazem resistência a disciplinar o porte e a posse de armas.
A consciência nacional exige uma decisão. O Rio de Janeiro, vítima desse processo, movimenta-se e faz uma manifestação exemplar, com milhares e milhares de brasileiros, tendo a participação do Ministro da Justiça, doutor Márcio Thomaz Bastos, para pedir o fim das armas.
Todos se indagam: por que não banir as armas? Por que não dedicarmos um dia a um mutirão nacional pelo desarmamento? O que impede a votação do projeto?
Não há explicação lógica para postergar tanto.
Criam-se discussões paralelas e artificiais para fugir do núcleo da questão.
Modifica-se e deseja-se que o porte ilegal de arma seja crime afiançável. Isto é, a pessoa que é presa com uma arma defende-se com o pagamento de fiança, R$ 50. Sai, fica solta, compra outra arma e continua disponível para se tornar mais um criminoso.
Uma das medidas propostas é consultar o povo, num plebiscito, para saber se os brasileiros querem ou não a licenciosidade das armas. Retira-se do texto essa medida, nem aos brasileiros se deseja ouvir.
Nesse clima e nessa confusão inexplicável, nada se faz. Continua a violência, a insegurança e fica o apelo terrorista: "Armem-se uns aos outros", em vez de "amem-se uns aos outros".
Quando vamos comemorar: adeus às armas?


José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.


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