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A renúncia de Fidel
Uma transição negociada
permitiria aos cubanos
livrar-se de uma tirania sem
pôr a perder avanços na
educação e na saúde
O IMPACTO da renúncia
de Fidel Castro Ruz, 81,
aos principais cargos
que ocupava no regime
cubano é acima de tudo simbólico. Em termos práticos, a abdicação apenas oficializa a situação
que já vigorava desde julho de
2006, quando o ditador se afastou para tratamento médico.
Quem exerce o poder interinamente desde então é o irmão de
Fidel, Raúl Castro, 76, secundado
por um grupo de dirigentes mais
jovens e supostamente mais
pragmáticos. Sobre esse núcleo
deverá recair a tarefa de dar continuidade ao que se afigura como
uma transição lenta e gradual rumo, não à democracia, mas a uma
economia mais aberta ao mercado e tutelada pelo Estado, nos
moldes chineses.
No plano político, se os sucessores de Fidel Castro tiverem a
oportunidade, conservarão intacta a natureza autoritária do
regime e o sistema de partido
único. É claro que estratégias como essa são mais fáceis de conceber do que de executar. Há variáveis que escapam ao controle até
de ditadores, mas o apoio financeiro de Hugo Chávez, que faz as
vezes da antiga URSS, é um elemento que ajuda os planos continuístas da ditadura cubana.
Cabe à comunidade internacional tentar influir para que a
abertura econômica ensaiada
por Havana se converta também
em abertura política. Nesse quesito, o papel de Washington será
determinante.
Por ora, o governo norte-americano anunciou que nada muda.
O embargo à ilha será mantido.
Só que em janeiro do próximo
ano haverá um novo presidente
na Casa Branca e ele terá a chance de rever o complicado relacionamento entre os EUA e Cuba.
O ideal seria que aliviasse as
restrições econômicas impostas
a Havana. Tal prática tem servido
muito mais para Fidel e seus asseclas se justificarem no poder
-imputando a Washington todos os males da ilha- do que para
arrancar-lhes concessões democráticas.
Espera-se que o próximo presidente dos EUA consiga libertar-se da tão poderosa quanto contraproducente influência dos
emigrados cubanos da Flórida e
estabelecer um diálogo franco e
produtivo com Havana. É muito
mais fácil influir sobre um país
participando ativamente de sua
economia do que vociferando-lhe ameaças à distância.
Uma transição não-traumática
é o que de melhor poderia acontecer para os cubanos. Sem pôr a
perder os avanços no campo da
educação e da saúde que o regime
de Fidel Castro logrou obter, dariam adeus a uma tirania que durante quase meio século perseguiu e eliminou implacavelmente adversários políticos.
Se os números oficiais estão
corretos, Cuba é um país com nível de renda de padrão latino-americano, mas que exibe indicadores sociais acima da média da
região. Não que a liberdade seja
uma mercadoria negociável. Mas
não é o caso de jogar fora o que foi
tão duramente conquistado apenas para marcar diferenças políticas.
Que a renúncia de Fidel seja o
prenúncio de novos tempos para
os cubanos.
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