São Paulo, sexta, 20 de março de 1998

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A hora e a vez da reforma tributária

JOSÉ SARNEY

Todos dizem que a reforma tributária é a mais necessária e a mais urgente de todas. Mas foi aquela que ficou mais atrás e até hoje não saiu. De quem é a culpa? Do Congresso? Não! O governo, que ali detém a maioria e a prioridade das matérias, julgou-a polêmica e prejudicial ao seu projeto, uma vez que mexe nos recursos de Estados e municípios. Julgo o enfoque que sempre foi dado como uma visão equivocada, com motivações tímidas.
Friedman, o papa da reforma tributária americana, resumiu numa frase, quase proverbial, o que ela deve ser: "Reforma tributária é diminuir impostos". E quando Reagan aceitou sua tese, baixou os impostos. O que ocorreu? A base dos contribuintes aumentou, diminuiu a sonegação, houve sobra nos recursos privados para investimentos. Esses criaram empregos e aumentaram a produção, o país cresceu e, crescendo, gerou mais impostos. O governo teve mais recursos e os Estados Unidos retomaram a liderança econômica ameaçada pela URSS e Japão. Pôde propor o projeto militar de Guerra nas Estrelas, os soviéticos não puderam acompanhar e o desmoronamento do mundo comunista foi apressado, já que o seu fim viria inevitavelmente pelas suas próprias contradições internas.
Mas não se pense que a coisa é tão simples. A reforma tributária tem de vir acompanhada de outras medidas de profundidade: a desregulamentação e a simplificação da cobrança de tributos; a modernização do aparelho arrecadador, cruzar informações e tornar a burla fiscal impossível. E mais do que isso: fixar-se nos impostos insonegáveis. Exemplo: a CPMF. Não custa nada ao governo federal para arrecadar, para fiscalizar, e não tem a desvantagem dos impostos indiretos, que atingem os mais pobres de igual modo que os mais abastados, e é pago no pão, no arroz, no feijão.
Há no Congresso um excelente projeto do deputado Luís Ponte, como base de partida para uma mudança radical nessa área. Uma reforma para valer, com outra filosofia, outro alcance. É claro que não é um projeto perfeito. Precisa de debate, aprimoramento. A filosofia e o mecanismo são bons.
Enquanto não se faz a verdadeira reforma fiscal ficamos nesse velho método. Em momentos de crise, aumentam-se os impostos (veja-se o aumento de alíquota de 25% para 27,5% no Imposto de Renda), vem um corte horizontal de despesa, não seletivo; aumenta-se o juro, despede-se pessoal e surge um outro dragão, pior do que a inflação, que é a recessão.
Essa fórmula não tem resolvido nada e somente tem agravado os problemas sociais e humanos.
Afinal, o que se deseja criar? Uma sociedade em que o cidadão paga saúde, paga pedágio, paga escola, paga segurança, paga todos os serviços do Estado. Para onde vão os nossos impostos, arrancados do bolso do contribuinte? Para a burocracia e para o pagamento dos juros da dívida pública. Algo está errado nesse modelo. O Estado, nesse quadro, fica apenas sendo um trambolho explorador. Não protege o cidadão, não harmoniza a sociedade, não presta serviços.


José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.



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