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São Paulo, domingo, 20 de abril de 2003

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APERTO PERENE

Na proposta de Lei de Diretrizes Orçamentárias que enviou ao Congresso, o Executivo introduziu a diretriz de ajustar o nível do superávit primário nas contas públicas (o excedente de receitas sobre as despesas, excluídas as despesas financeiras) de acordo com as flutuações da economia. Discussões sobre as diretrizes gerais da LDO passaram a se concentrar nesse ponto.
Propõe o governo que, quando a economia crescer mais que o previsto, deverão ocorrer cortes de gastos públicos para atingir uma meta de superávit maior. E vice-versa: quando a economia se desaquecer e o PIB for menor que o esperado, seriam permitidos aumentos de gastos (ou cortes de impostos) que, ao custo de gerar um resultado fiscal menor, teriam o efeito compensatório de reanimar um pouco a economia.
A política fiscal ajudaria a amenizar flutuações da atividade econômica, desempenhando papel "anticíclico".
Ao observador desavisado, pode parecer uma novidade -afinal, nos últimos anos, sob a pressão das dificuldades de financiamento das contas externas e da dívida pública, a política fiscal foi apertada, desempenhando um papel "pró-cíclico", ao contribuir para agravar a perda de dinamismo da economia. Mas manejar a política fiscal de modo anticíclico está longe de ser novidade: é um preceito há décadas consagrado em livros-textos de macroeconomia.
O ponto principal da proposta do governo é outro: reside em fixar o nível expressivo de 3,75% do PIB como piso do superávit primário para os próximos anos. Isso corresponde a propor um aperto fiscal perene, voltado a produzir redução contínua e expressiva da dívida líquida do setor público como proporção do PIB. É uma sinalização forte: a centralidade do aperto fiscal, que as novas autoridades econômicas de início justificaram como resposta a uma situação emergencial, vai se transmutando em programa de governo.
Ao colocar o foco das preocupações na redução progressiva do estoque da dívida, outros aspectos são deixados de lado. Um deles é a questão das condições de rolagem da dívida pública. O que torna a dívida pública um grave fator de limitação do raio de manobra da política econômica não é o seu tamanho, considerado em si mesmo, mas as condições em que ela é financiada: o seu perfil de vencimento excessivamente curto, a indexação de grande proporção dos títulos públicos (ao câmbio, aos juros e a índices de preços) e seu custo elevado para o governo, determinado pela prática de juros altos.
Reduzir a dívida sem aliviar esses constrangimentos -e ao custo de manter os investimentos públicos persistentemente comprimidos- pode ser uma vitória de Pirro.


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