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CARLOS HEITOR CONY
O novo chapéu do Vilaça
RIO DE JANEIRO - No vocabulário dos comunistas de antanho, após o
insulto de chamar alguém de "policial", vinha um outro, quase equivalente em carga pejorativa: "agente
provocador". Frequentemente eram
a mesma pessoa, mas, enquanto o
policial entregava companheiros na
delegacia mais próxima, o agente
provocador criava condições para isso. Dava no mesmo.
Marcos Vilaça, autor de um clássico de nossa literatura, "Coronel, Coronéis", tornou-se um agente provocador contumaz para os meus lados.
Houve o caso do primeiro chapéu, em
que o vi num avião para Marselha,
na Copa do Mundo de 1998. Parecia
um milionário, dono de poços de petróleo no Texas, de rebanhos vacuns
na Argentina, de minas de cobre no
Chile, de cafezais em São Paulo.
Tantas fiz, tantas indiretas lhe dei,
que, para se ver livre, livrou-se do
chapéu e mandou-o para mim. Hoje
ocupa lugar de honra no meu escritório e, eventualmente, lugar mais modesto na minha cabeça.
Depois foram os lenços de seda finíssima, de grifes sofisticadas, que ele
fazia questão, ao me abraçar, de esfregar na minha cobiça. Minha coleção aumentou com o tempo, já tenho
quatro e aguardo outros.
Eis que, na semana passada, ele novamente deslumbrou-me penetrando na Academia com um chapéu novo, rigorosamente igual ao anterior.
Com uma desvantagem: sem a pátina do tempo, é um chapéu zero quilômetro, não rodado nos muitos caminhos que ele percorre pelo mundo
afora.
Apesar da evidente provocação,
prometi que não me entusiasmaria
pelo seu novo chapéu. Prefiro o antigo, que agora é meu, que com ele subiu nas pirâmides do Egito, penetrou
respeitosamente no Taj Mahal, protegeu do sol rigoroso do Senegal a sua
bela cabeça de filho de Nazaré da
Mata, em Pernambuco.
Vilaça desmentiu, com séculos de
atraso, aqueles sacerdotes do templo
de Jerusalém que, quando souberam
que Jesus era também de uma outra
Nazaré, diziam que de lá não vinha
nada que prestasse.
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