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TENDÊNCIAS/DEBATES
Há medidas de curto prazo capazes de
minorar significativamente a violência?
SIM
Ordem nos presídios
MAURÍCIO ZANOIDE DE MORAES
Há uma falsa noção entre nós de
que a mais rápida e eficiente forma
de se acabar com a violência é estabelecer uma dura repressão policial, sendo
tolerável, por alguns, inclusive, a matança de pessoas (criminosas ou não).
Tal medida não só é ineficiente como
também é, em si, uma violência geradora de mais violência. É defendida apenas
por aqueles que julgam a si e a seus familiares pessoas imunes a esse tipo de
extermínio, na vã esperança de que tais
atos recaiam, tão-somente, sobre a população excluída e marginalizada.
Há, porém, medidas a serem tomadas
a curto prazo e que de modo legal, eficiente e produtivo podem reduzir em
muito a violência. Tomemos por exemplo a violência que na última semana assolou a todos: o poderio da alta criminalidade carcerária em determinar e controlar ataques nas cidades paulistas.
Inegavelmente, essa violência teve como causa próxima a total ineficiência
dos entes públicos em controlar e estabelecer disciplina e ordem dentro dos
presídios. Dizer que se pode controlar a
"panela de pressão" carcerária com regime prisional de isolamento e cárcere
"duro" ou "diferenciado" é negar a realidade da superpopulação carcerária.
Essa violência proveniente do cárcere
passa por outra forma de ver e entender
o sistema penitenciário. O Estado nunca
percebeu que em um ambiente de superpopulação carcerária (criado, tolerado e incentivado pelo próprio Estado)
não é possível haver controle, imposição de disciplina dura e imposição de
tratamento diverso para cada grupo de
condenados. O Estado, porém, em todas as suas esferas, poderá tomar, rapidamente, providências para, com essa
mesma estrutura prisional, sem a construção de sequer mais um presídio ou
cela, resolver a questão de forma racional, legal e eficiente. As três esferas de
poder deverão, então, agir de modo integrado e harmônico.
O Poder Legislativo tem em suas
mãos, desde 2001, projeto de lei de reforma da Lei de Execução Penal, proposta que a atualiza e a moderniza de
forma sistêmica, e não apenas pontual.
Nele se aumenta o rigor disciplinar e, já
em 2001, se previa como falta grave o
porte de celular, além de se estabelecer
um sistema de faltas disciplinares extremamente controlador e útil para tratar
cada preso de forma diferenciada, fazendo com que os melhores possam
progredir, e os piores, regredir no cumprimento da pena.
Esse projeto, para mostrar a sua seriedade, também defende que a progressão do regime fechado para o regime semi-aberto se realize com o cumprimento de um terço da pena, e não, como é
hoje, de um sexto.
Ao Legislativo caberá, portanto, analisar e aprovar um projeto de lei que existe desde 2001. Ao Poder Judiciário, juntamente com o Ministério Público e as
Defensorias, caberá fazer um mutirão
para verificar a situação de todos os presos que já preencham as condições objetivas e subjetivas para progredir no
sistema, o que em muito diminuiria a
tensão interna nos presídios, sem com
isso se correr o risco de se soltar (última
fase do sistema de progressão de penas)
pessoas que não tinham condições de
voltar ao convívio social.
O Judiciário, também, deverá mudar
sua majoritária mentalidade de que todo condenado deve ser preso. As penas
alternativas (aplicáveis a crimes sem
violência à pessoa) são mais eficientes e
baratas para se punir e reeducar socialmente a pessoa, evitando o deletério
contato com presos perigosos.
O Poder Executivo, por sua vez, pode
liberar, imediatamente, mais verbas para modernizar as estruturas prisionais
já existentes (adotando, por exemplo,
detector de metais) e investir fortemente na seleção e capacitação de profissionais para trabalharem no sistema penitenciário, acompanhando e treinando-os periodicamente.
O Executivo deve, ainda, cumprindo a
lei já existente, ensinar uma profissão ao
preso para, nos últimos instantes de sua
pena, proporcionar-lhe a oportunidade
de um emprego e de um local para se
restabelecer.
Com essas iniciativas imediatas, entre
tantas outras, o poder público já eliminará muitas das causas diretas da violência que nos assolou nessa semana e
dará passos para consertar definitivamente o sistema penitenciário. Porém
esse primeiro passo é sempre o mais difícil, e ele consiste em que o Estado reconheça que não cumpriu seus deveres sociais e legais e que durante décadas escolheu projetos públicos equivocados.
Enfim, o Estado mudará seus rumos na
busca desse modo eficiente e construtivo de agir em prol de todos, e não apenas de alguns.
Maurício Zanoide de Moraes, 39, advogado, é
presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais e professor de processo penal da USP.
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