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São Paulo, sábado, 20 de setembro de 2003

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LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

A mágica dos pequenos gestos

Esperamos todos grandes mudanças. E com razão. Mas, enquanto não acontecem, temos de perceber o sofrimento dos milhões de brasileiros que carecem do necessário à vida. São múltiplas as causas. O que mais preocupa é o alto índice de desemprego. É um drama, aliás, que atinge os vários níveis da sociedade em quase todos os países.
A falta de trabalho acarreta o empobrecimento, cada vez maior, e acaba gerando a mendicância, o desespero e, infelizmente, o incremento do narcotráfico e de outras pseudo-soluções que degradam a pessoa humana.
Nos últimos meses, como fruto de um sistema que aumentou a desigualdade social e a exclusão, tem havido graves restrições para a economia familiar, que afetam não só os mais pobres, mas até os que tinham alcançado um certo equilíbrio entre salário e custo de vida. São fatores significativos do desequilíbrio na economia familiar o aumento do preço do botijão de gás, da conta de luz, do arroz, dos remédios e dos transportes e a enorme perda de poder aquisitivo do salário mínimo. Isso vem acarretando a contenção de gastos, o atraso nos pagamentos e a perda progressiva da alegria contagiante de nosso povo.
Sabemos que nossos dirigentes estão se empenhando para resolver os problemas complexos que até hoje permanecem sem a devida solução. Além dos desacertos internos do país, há inúmeras pressões e dependências internacionais que agravam ainda mais a situação. Temos de reconhecer que várias iniciativas têm sido empreendidas. Basta recordar a série de medidas para superar a miséria e a fome, acelerar a alfabetização e oferecer incentivos aos pequenos agricultores. Acalentamos a esperança de ver, em breve, os efeitos do Fome Zero. Isso requer, porém, a difícil conjugação de esforços entre os dirigentes em nível municipal, estadual e da União e as demais forças vivas da sociedade para promover políticas públicas adequadas. Temos muito que progredir no reto discernimento das metas e na articulação de esforços para atender, o quanto antes, à expectativa do povo.
Há, no entanto, uma cooperação pessoal, familiar e comunitária que é fundamental e não pode faltar para o encaminhamento de uma solução definitiva do problema da desigualdade e da injustiça social. Trata-se de uma atitude interior a cada pessoa na compreensão das exigências da cidadania e, mais ainda, da fraternidade cristã. É o compromisso com a promoção dos outros. Precisamos vencer o individualismo doentio e a busca de vantagens só para os próprios familiares e amigos e abrir-nos a uma atitude humanitária que se estenda a todos, a começar pelos mais necessitados.
O exemplo das primeiras comunidades cristãs leva-nos a redescobrir a alegria da partilha fraterna, a fim de que ninguém passe necessidade. Aqui entra em cena a mágica dos pequenos gestos de solidariedade. Se cada um de nós souber partilhar com os outros o que recebemos de Deus, não faltará nada para ninguém. São gestos modestos e discretos de auxílio ao próximo. Quem tem mais partilhe mais. A mágica não está apenas na rápida e maravilhosa multiplicação do atendimento aos necessitados, mas na progressiva transformação do nosso modo de agir. Vamos, então, aprender que a solução dos graves problemas sociais começa pela conversão de nossas atitudes. A sociedade, já nesta terra, será não só justa, mas feliz. É isto que Jesus Cristo nos ensinou: a alegria maior é a de quem dá (Atos, 20, 35).


Dom Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.


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