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Longo caminho
Fabricação de princípio ativo de droga contra a Aids ainda é pouco para diminuir dependência de fármacos importados
A FAÇANHA da Fiocruz ao
desenvolver o princípio ativo do remédio
anti-Aids mais usado
no programa nacional de combate à doença, o efavirenz, deve ser
interpretada sob dois ângulos.
Do ponto de vista da saúde pública e seu financiamento, constitui
uma boa nova. Diante do objetivo estratégico de estimular um
setor industrial de fármacos autônomo, é duvidoso que represente um passo significativo.
O feito possibilitará a fabricação no país de uma versão genérica do efavirenz, hoje importado da Índia a US$ 0,45 por pílula.
Antes da licença compulsória do
anti-retroviral, em maio de
2007, o Ministério da Saúde pagava mais que o triplo disso ao
detentor da patente, o laboratório Merck Sharp & Dome.
A decisão de quebrar a patente
veio após uma negociação fracassada. O governo almejava
chegar ao preço pago na época
pela Tailândia, US$ 0,65, mas a
contraproposta ficou longe disso. Optou-se pela licença compulsória, em nome do interesse
público, o que está previsto na lei
brasileira e em tratados de proteção à propriedade intelectual.
Mais importante que economizar foi comprovar que há
competência tecnológica no país
para desenvolver e testar um
princípio ativo. É uma condição
necessária para desenvolver o
setor de fármacos no país e reduzir sua dependência da importação de produtos da química fina.
Teria sido melhor demonstrar
essa capacidade antes de quebrar
a patente, e não mais de um ano
depois. Isso teria aumentado o
poder de barganha do Estado,
possivelmente evitando a medida extrema. Para um país que
busca atrair investimentos no
setor de fármacos, licenças compulsórias emitem sinal negativo
para as grandes multinacionais.
Tais empresas faturam dezenas de bilhões por ano e reinvestem até 1/5 em pesquisa e desenvolvimento (P&D). Por isso são
ciosas das patentes, garantia de
retorno sobre o investimento.
As farmacêuticas brasileiras,
apesar de avanços recentes, não
têm tradição de pesquisa nem fôlego financeiro para se tornarem
tão cedo de fato inovadoras. Farmanguinhos, da Fiocruz, é um
laboratório público, que se associou com duas empresas privadas nacionais para desenvolver o
efavirenz. Esse é o caminho:
criar consórcios para aglutinar
competências e ganhar escala,
com foco na inovação que vá
além da simples cópia de medicamentos consagrados.
O governo federal lançou em
2004 uma política industrial e
tecnológica para o setor, financiada pelo BNDES. O programa
foi renovado pelo banco há menos de um ano e irá até 2012, com
dotação de R$ 3 bilhões. Há R$ 1
bilhão de projetos aprovados e
contratados em carteira, mas a
maioria é de implantação de unidades produtivas, não de P&D.
Falta muito para o Brasil conseguir repetir o exemplo da Índia. Algumas farmacêuticas do
país asiático enxergaram que só
tinham futuro investindo decididamente em inovação. Tornaram-se competitivas em genéricos no mercado mundial e passaram a respeitar patentes. Depois
disso é que grandes empresas
multinacionais reconheceram a
competência indiana e levaram
para lá laboratórios de P&D.
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