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BORIS FAUSTO
Na rota do capitalismo
A rrisco uma constatação, sujeita a chuvas e trovoadas. Pelo que
se viu até agora, os novos ocupantes
do poder assumiram com convicção a
rota do capitalismo. A novidade é que
a rota não passa pelo tempero da socialdemocracia, mas do capitalismo
sem muitas nuances, quem diria, à
moda americana.
De saída, convém ressaltar o que já
se sabe. O governo Lula tinha objetivos claros no terreno econômico e nenhuma clareza, ou mesmo prioridade,
de como operar no plano social. Não é
demais sugerir que as fanfarras iniciais do Fome Zero foram um hábil
contrafogo antecipado às queixas populistas ou de esquerda quanto aos rumos da política econômica.
A operação realizada nesse campo,
aliás com pleno êxito apesar dos estragos sociais, não obedeceu apenas à necessidade de enfrentar problemas já
existentes, agravados por uma transição que provocava inquietações. O
governo atual embarcou com convicção na tarefa de restaurar a confiança,
assumindo os pressupostos do governo anterior -responsabilidade fiscal,
combate à inflação, respeito aos contratos-, que são hoje os pressupostos
da maioria das nações civilizadas.
Mas é evidente que a transição sem
aventuras espera abrir caminho para
um tipo de crescimento sustentado,
tendo como premissa básica, como
disse o deputado Gabeira, um produtivismo do qual adviriam benesses
materiais repartidas para toda a população, embora de forma desigual.
Nesse rumo, vários temas, muito caros ao PT no passado, mudam de significação. As questões ambientais cedem terreno às necessidades imperiosas do crescimento e são vistas mais
como um embaraço, a exemplo do caso dos transgênicos, ainda que aí nem
tudo esteja definido. Ao mesmo tempo, movimentos sociais acalentados
por décadas passam a ser incômodos,
e etnias são tratadas como vestígios
arcaicos do passado.
Desse modo, o presidente e membros de seu governo estão dispostos a
conversar indefinidamente com o
MST e organizações afins, mas não
parecem dispostos a acolher suas reivindicações e menos ainda seus métodos de luta. Por sua vez, a população
indígena é encarada como um obstáculo para o desenvolvimento e para a
segurança da região amazônica, em
contraste com a atenção que lhe foi
dedicada em governos anteriores.
Seria errôneo acreditar que, nas condições brasileiras, questões vitais como a do desemprego, entre outras, serão simplesmente ignoradas. Mas não
há nenhum esforço voluntarista para
ampliar a oferta de empregos ou reduzir as desigualdades sociais. A questão
das relações trabalhistas foi deixada
para o segundo tempo da agenda de
reformas, ficando no ar uma pergunta
acerca de como o governo tratará a inquietante questão da flexibilização das
relações de trabalho, da qual resultaria, quem sabe, uma redução da informalidade.
Muita coisa ainda está por vir, tanto
no plano externo quanto interno, e
neste último o governo não poderá fechar-se às pressões da sociedade e de
sua base partidária. Mas o núcleo duro
do governo e do PT parece ter atravessado o rio para valer, deixando muita
gente tão espantada quanto desorientada na outra margem.
Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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