São Paulo, sábado, 20 de outubro de 2007

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Licença civilizada

Senado aprova extensão opcional de afastamento de mães para aleitar por 6 meses, de acordo com recomendação da OMS

NESTA SEMANA o Senado deixou de lado a baixíssima política que por mais de quatro meses vinha marcando a Casa. Aprovou o projeto da senadora Patrícia Saboya (PDT-CE) que estende a licença-maternidade de quatro para seis meses. Não são muito freqüentes os atos congressuais capazes de obter um consenso tão amplo.
A iniciativa foi endossada por unanimidade na Comissão de Direitos Humanos do Senado. Por seu caráter terminativo, permanece aberta para discussão por cinco dias e, não havendo recurso por parte de algum senador, segue diretamente para a Câmara de Deputados. É de prever que seja aprovada sem percalços, porque são preponderantes as razões para fazê-lo.
Em primeiro lugar, a proposta elimina certo descompasso entre a licença prevista na Constituição (artigo 7º, inciso XVIII), de quatro meses, e o consenso científico de que o aleitamento materno deve durar seis meses.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que essa seja a fonte exclusiva de alimento do recém-nascido nos primeiros 180 dias de vida, não só porque o leite materno contém todos os nutrientes necessários como também porque o protege de doenças infecciosas e crônicas -o que ajuda a reduzir a mortalidade infantil. Além disso, o vínculo íntimo com a mãe promove o desenvolvimento sensorial e cognitivo do bebê, de acordo com a OMS.
Faz sentido, portanto, prolongar a licença-maternidade, mas apenas se a inovação não contribuir para limitar a contratação de mulheres por empresas. O projeto de lei se antecipa a esse efeito indesejável por meio de dois dispositivos: torna voluntária a medida e desonera o empregador de pagar o salário nos dois meses adicionais.
As companhias poderão ou não aderir ao Programa Empresa Cidadã; caso o façam, credenciam-se a deduzir, no cálculo do Imposto de Renda, o valor da remuneração integral da trabalhadora nos 60 dias de prorrogação. Mesmo na empresa credenciada, a mãe terá de requerer o benefício até um mês após o parto. Se avaliar que isso pode prejudicar sua carreira, não estará obrigada a adotar o prolongamento.
Uma objeção possível seria o peso da renúncia fiscal envolvida. Projeções apresentadas na justificação da iniciativa, porém, indicam que seriam no máximo R$ 500 milhões ao ano -um custo relativamente baixo, diante do benefício esperado. Por fim, não parece plausível o argumento de que a extensão do afastamento venha agravar a discriminação contra mulheres nos processos de seleção, pois o ônus de encontrar e treinar um substituto já existe hoje, com quatro meses.
A Câmara deve seguir o exemplo do Senado e aprovar o projeto de lei. Sua única limitação é não contemplar as trabalhadoras sem carteira assinada, mas essa é uma questão que só se resolverá com a formalização do mercado de trabalho -algo que depende de um esforço de outra ordem, e muito maior, da parte de legisladores e autoridades.


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