São Paulo, quarta-feira, 20 de novembro de 2002

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EFEITOS COLATERAIS

Número crescente de analistas recomenda ao BC aumentar os juros básicos em sua reunião de hoje, como resposta à alta da inflação. Muitos discordariam, recordando que a pressão sobre os preços advém da alta do dólar -um choque de custos ao qual, sobretudo num contexto de crédito externo fechado ao país, parece inadequado responder com um aumento dos juros.
Atentos a esse argumento, os defensores da elevação dos juros apontam que a alta dos preços não se restringe a poucos itens, mas se generalizou. Isso indicaria que há pressões de demanda, às quais caberia responder elevando os juros.
Mas a generalização dos reajustes de preços é um indício apenas indireto de alta da demanda. Essa generalização pode ter outras raízes. Muitos itens têm seus preços, ou boa parte de seus custos, atrelados diretamente ao dólar; ao lado disso, os reajustes nominais de salários estão em discreta aceleração -o que pode se dever mais à influência da alta da inflação observada desde 2001 do que a um mercado de trabalho aquecido.
Seria o caso de buscar evidências diretas de aquecimento da demanda interna. Essas são poucas e, sobretudo, não são generalizadas. É por isso que o quadro geral da atividade econômica é de quase estagnação.
Os focos mais significativos de demanda dinâmica estão nos setores de bens de consumo duráveis e de imóveis. O efeito inibidor sobre esses preços de uma alta de juros tenderia a ser limitado, dado que o aumento da demanda por esses bens parece se alimentar de um desejo dos segmentos de renda média e alta de, diante da incerteza, diversificar os ativos que utilizam como reserva de valor.
O balanço entre os benefícios e os custos de nova elevação dos juros não parece favorável. Sua contribuição para a desaceleração dos índices de varejo tenderia a ser lenta e limitada. Mas os efeitos colaterais seriam sérios: o custo da dívida pública subiria, criando pressões por elevação compensatória da meta de superávit primário. E, numa economia em contração, com arrecadação de impostos prejudicada, atingir essa meta tenderia a se revelar cada vez mais difícil -criando o risco de que surgissem impasses com o FMI.


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