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CLÓVIS ROSSI
Um filme sem mocinhos
LOS ANGELES - Pelo menos na TV e nos jornais, os Estados Unidos já estão em guerra. É, de longe, o assunto
predominante nos telejornais e no
noticiário da mídia impressa.
Tem algo de assustador, mas tem,
acima de tudo, um quê de ridículo. A
vinheta de um dos telejornais é
"Showdown with Saddam" (Duelo
com Saddam).
Salvo erro de memória, há um clássico do cinema de faroeste com
"showdown" no título. Não é mera
coincidência: o ambiente é mesmo de
mocinho versus bandido.
Para quem, como eu, a rigor aprendeu a ler nos livros e revistas de meu
pai, predominantemente relativos à
2ª Guerra Mundial (1939/45) e, na
maioria, vista por olhos norte-americanos ou pró-EUA, o contraste é que
traz a sensação de ridículo.
Era épico, de fato, um "showdown"
com Hitler. Havia a chance de vitória
do outro lado e, com ela, o horror absoluto, universal. Não é que Saddam
Hussein deixe de ser um carniceiro
horroroso. Mas não tem a mais remota chance de ganhar ou sequer de
empatar o jogo com os EUA.
Mais: ao fim da 2ª Guerra, de fato a
democracia se estendeu por toda a
Europa, inclusive pelos países derrotados. Depois dela, o papel dos Estados Unidos como indutor da democracia é, no mínimo, discutível.
Vide o caso chileno: um presidente
democrático e constitucional, como
Salvador Allende, destronado para
ceder o lugar a um carniceiro não
muito diferente de Saddam Hussein,
como Augusto Pinochet, com farto financiamento dos EUA, além de suporte político e do boicote econômico
ao regime constitucional.
Os sucessores de Saddam, impostos
por Washington, serão mesmo melhores que ele? Quem convidaria para uma festa da democracia os senhores da guerra que tomaram o lugar do Taleban no Afeganistão depois da ofensiva dos EUA?
O mundo é bem mais complexo do
que essa tosca idéia de "showdown"
hoje aqui, amanhã ali.
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