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São Paulo, sexta-feira, 21 de fevereiro de 2003

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CLÓVIS ROSSI

Um filme sem mocinhos

LOS ANGELES - Pelo menos na TV e nos jornais, os Estados Unidos já estão em guerra. É, de longe, o assunto predominante nos telejornais e no noticiário da mídia impressa.
Tem algo de assustador, mas tem, acima de tudo, um quê de ridículo. A vinheta de um dos telejornais é "Showdown with Saddam" (Duelo com Saddam).
Salvo erro de memória, há um clássico do cinema de faroeste com "showdown" no título. Não é mera coincidência: o ambiente é mesmo de mocinho versus bandido.
Para quem, como eu, a rigor aprendeu a ler nos livros e revistas de meu pai, predominantemente relativos à 2ª Guerra Mundial (1939/45) e, na maioria, vista por olhos norte-americanos ou pró-EUA, o contraste é que traz a sensação de ridículo.
Era épico, de fato, um "showdown" com Hitler. Havia a chance de vitória do outro lado e, com ela, o horror absoluto, universal. Não é que Saddam Hussein deixe de ser um carniceiro horroroso. Mas não tem a mais remota chance de ganhar ou sequer de empatar o jogo com os EUA.
Mais: ao fim da 2ª Guerra, de fato a democracia se estendeu por toda a Europa, inclusive pelos países derrotados. Depois dela, o papel dos Estados Unidos como indutor da democracia é, no mínimo, discutível.
Vide o caso chileno: um presidente democrático e constitucional, como Salvador Allende, destronado para ceder o lugar a um carniceiro não muito diferente de Saddam Hussein, como Augusto Pinochet, com farto financiamento dos EUA, além de suporte político e do boicote econômico ao regime constitucional.
Os sucessores de Saddam, impostos por Washington, serão mesmo melhores que ele? Quem convidaria para uma festa da democracia os senhores da guerra que tomaram o lugar do Taleban no Afeganistão depois da ofensiva dos EUA?
O mundo é bem mais complexo do que essa tosca idéia de "showdown" hoje aqui, amanhã ali.


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