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São Paulo, sexta-feira, 21 de março de 2003

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MARCELO BERABA

Sem o leão da Metro

RIO DE JANEIRO - A gente se acostuma a quase tudo na vida. Assim, imagino que, mais guerra, menos guerra, a gente vá acabar considerando normal esperar o começo de um massacre confortavelmente sentado na poltrona, diante da TV, no recanto do lar.
Enquanto o organismo não metaboliza mais essa aberração, é bom reconhecer: foram um horror aqueles primeiros minutos das imagens ao vivo de Bagdá, na quarta à noite, quando o mundo parou para ver a máquina de guerra de Bush em ação.
As sirenes ligadas e a voz da locutora indicavam a iminência do bombardeio, que custou a acontecer. As paisagens imóveis, exceto por um veículo ou outro que lentamente transitava pela cidade ainda escura, aumentavam a agonia da espera. E aí, essa guerra começa ou não começa?
Mais uma vez, a confusão entre a realidade e a ficção, entre o jornalismo e o show. Aquilo não era um filme, mas parecia fazer parte da grade televisiva desde sempre, como o Oscar anual ou a Copa do Mundo.
Havia um nítido incômodo naquela cena. Era impossível não assistir a ela. Era antijornalístico não presenciar o fato mais jornalístico do ano. As imagens paradas hipnotizavam. Mas, ao mesmo tempo, havia um tanto de surreal e de doentio na espera. A humanidade quase toda diante de uma telinha esperando para ver os iraquianos serem destroçados.
Não importa que dois terços desta humanidade possam estar torcendo contra os Estados Unidos e a sua aliança bélica. Estávamos ali para assistir ao massacre anunciado.
Essa é a grande novidade destes tempos. A guerra com hora marcada, que permite organizar a agenda e esticar as pernas.


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