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MARCELO BERABA
Sem o leão da Metro
RIO DE JANEIRO - A gente se acostuma a quase tudo na vida. Assim,
imagino que, mais guerra, menos
guerra, a gente vá acabar considerando normal esperar o começo de
um massacre confortavelmente sentado na poltrona, diante da TV, no
recanto do lar.
Enquanto o organismo não metaboliza mais essa aberração, é bom reconhecer: foram um horror aqueles
primeiros minutos das imagens ao
vivo de Bagdá, na quarta à noite,
quando o mundo parou para ver a
máquina de guerra de Bush em ação.
As sirenes ligadas e a voz da locutora indicavam a iminência do bombardeio, que custou a acontecer. As
paisagens imóveis, exceto por um veículo ou outro que lentamente transitava pela cidade ainda escura, aumentavam a agonia da espera. E aí,
essa guerra começa ou não começa?
Mais uma vez, a confusão entre a
realidade e a ficção, entre o jornalismo e o show. Aquilo não era um filme, mas parecia fazer parte da grade
televisiva desde sempre, como o Oscar anual ou a Copa do Mundo.
Havia um nítido incômodo naquela cena. Era impossível não assistir a
ela. Era antijornalístico não presenciar o fato mais jornalístico do ano.
As imagens paradas hipnotizavam.
Mas, ao mesmo tempo, havia um
tanto de surreal e de doentio na espera. A humanidade quase toda diante
de uma telinha esperando para ver os
iraquianos serem destroçados.
Não importa que dois terços desta
humanidade possam estar torcendo
contra os Estados Unidos e a sua
aliança bélica. Estávamos ali para
assistir ao massacre anunciado.
Essa é a grande novidade destes
tempos. A guerra com hora marcada,
que permite organizar a agenda e esticar as pernas.
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