São Paulo, sexta-feira, 21 de junho de 2002

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CLÓVIS ROSSI

Os Neros de arrabalde

SÃO PAULO - Não faz muito, o presidente Fernando Henrique Cardoso produziu uma obviedade que, no entanto, parecia frase de campanha anti-PT. Disse que, se o próximo presidente for incompetente, o Brasil poderá virar uma Argentina.
Bom, ontem o Brasil estava uma Argentina. O risco-país subiu para um patamar que coloca a pátria tupiniquim acima até da Nigéria, o dólar já está arranhando os R$ 2,80, a agência de classificação de risco Moody's rebaixou a cotação do Brasil, e a JP Morgan, a instituição financeira que faz o índice do risco-país, avisou que, do jeito que está, a classificação do Brasil significa que o mercado espera o calote no máximo em seis meses (a dez dias da posse do novo presidente, portanto).
Seria, pois, Fernando Henrique Cardoso um incompetente?
Não sei. Mas o fato é que, além de virar uma Argentina, o Brasil está espalhando a crise para os demais emergentes, que, a propósito, submergem cada vez mais .
Pelo menos foi o que disse Eduardo Faria, economista-chefe do Banco Safra, a Paulo Henrique Amorim, do UOL News: a crise no Brasil já afeta os mercados emergentes.
Não deixa de ser uma cruel ironia: em vez de ser vítima do contágio argentino, o Brasil é que contagia os outros com seus males, cada vez maiores e mais doloridos.
Está ficando muito difícil convencer o distinto público de que a culpa da crise é de Luiz Inácio Lula da Silva, Ciro Gomes ou Anthony Garotinho. Mesmo assim, sempre haverá quem proponha que os três retirem suas candidaturas como única forma de tranquilizar os mercados.
Talvez funcione. Talvez seja tarde demais. O pessoal do governo que acendeu a fogueira da "argentinização", esperando que ela chamuscasse a oposição, deu uma de Nero de arrabalde: o Brasil está ardendo, e ninguém tem lira para tocar.



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