São Paulo, segunda-feira, 21 de junho de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CARLOS HEITOR CONY

A choradeira da derrota

RIO DE JANEIRO - Um dos problemas mais constrangedores dos cronistas esportivos é a necessidade diária de esconder a preferência pessoal, a obrigação de parecer imparcial e desinteressado, quando, desde criancinha, torceu adoidadamente por este ou por aquele clube.
Tirante casos especiais, como o de Nelson Rodrigues, que torcia descaradamente pelo Fluminense, de Ary Barroso, que fazia o mesmo pelo Flamengo, todos procuram, dentro de suas possibilidades, dar a impressão de que são leais à informação, isentos nos comentários. Os casos de Nelson e de Ary não contam, eles passaram à história por outros motivos, um no teatro, outro na música popular. Estavam se lixando para a objetividade no futebol, que encaravam como paixão -e aí valia tudo.
Passando da crônica esportiva para a crônica política, percebe-se o mesmo esforço em procurar a objetividade, a linha justa da isenção. Ao contrário do futebol, no qual as opções são tomadas na infância, o mais tardar na adolescência, e permanecem as mesmas por toda a vida, na política há variações de gênero e grau, "la donna è mobile", os valores mudam, os critérios se ajustam ou se reajustam dentro de conveniências pessoais ou profissionais
No recente duelo entre governo e oposição, provocado pelo aumento no salário mínimo, todos procuraram a objetividade profissional, pelo menos até que o apito final encerrasse a disputa no Senado, com a derrota do governo.
E aí, exatamente como no futebol, a choradeira foi geral, todos passaram recibo. A mídia ligada ao governo e ao PT atribuiu o resultado ao ressentimento, à indecente cobrança de cargos e verbas, desclassificando de alto a baixo a decisão da maioria. Escandalizados, apontam o absurdo de ACM e Heloísa Helena estarem eventualmente no mesmo lado. E se esquecem do absurdo maior de Lula estar hoje no mesmo barco do FMI.


Texto Anterior: Brasília - Fernando Rodrigues: Oligofrenia jurídica
Próximo Texto: José Serra: Da coluna às urnas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.