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JOSÉ SARNEY
Sem pão, sem razão
A imagem do Brasil no exterior
ainda não conseguiu alcançar um
nível de segurança fora de turbulências, de um país com uma perspectiva
de crescimento e bom desempenho de
futuro. Permanece a visão de uma
área instável, onde se exerce uma especulação de ganância, lugar ideal para esse capital de curto prazo marcadamente aventureiro. Os investimentos de longo prazo, segundo afirmam,
estão circunscritos às grandes empresas globais, que têm antigos interesses
no Brasil e se posicionam para não
perder mercado diante da competição, à frente delas o setor automobilístico. É a opinião que se ouve quando
se viaja num mundo dominado pela
visão da economia, setor que realmente está globalizado e desestabilizou a soberania dos Estados que não
controlam suas decisões, em mãos de
gigantescas companhias que funcionam sem nacionalidade nem fronteiras. Assim, hoje, são os mercados globais, que decidem qual o destino de
qualquer Estado nacional.
Principalmente na Europa, onde os
assuntos humanos são mais sensíveis,
pesa sobre o nosso país um outro
agravante de imagem, que é de uma
sociedade fracionada por desigualdades comprometedoras, concentração
de renda que a cada dia se torna
maior, a violência urbana, os massacres, os menores de rua, a prostituição
infantil e uma anarquia política sem
controle, cuja face é mostrada pelas
crises em cadeia que se sucedem sem
parar. Essa visão, algumas vezes hipócrita, não parece retroceder.
Por outro lado, todos falam que o
Brasil abandonou o seu destino nacional, perdeu identidade e, hoje, alinhou-se completamente aos Estados
Unidos, passando a uma situação de
satélite. Os europeus dizem isso com
um toque de decepção e ressentimento. Na França e em Portugal, já não se
escondem essas críticas, que estão
saindo dos formadores de opinião pública para ganhar setores dos próprios
governos.
O problema é saber até que ponto
essas imagens se fundem entre o real e
o simbólico, entre a versão e o fato.
Nós pagamos um preço altíssimo com
a mudança no regime de câmbio e
ainda não cicatrizaram de todo as feridas daquela decisão. O balanço é que
foi correto, como atestam os resultados que estão aí com a melhoria dos
números macroeconômicos. Mas não
tenhamos a ilusão de que saímos completamente da berlinda.
O Brasil fez um esforço gigantesco.
Não aconteceu a catástrofe que profetizaram e aqui não tivemos o que
ocorreu com a Rússia e alguns países
asiáticos. Mas não obtivemos as condições de decisão para voltarmos a
crescer e, sem desenvolvimento, o esforço de estabilização da economia
não rende os frutos que a nação esperava. As expectativas se frustram e o
terreno político fica movediço.
Dentro e fora do Brasil, só teremos
argumentos para combater as imagens falsas e as leituras preconceituosas sobre o nosso caminho com o crescimento econômico. Com o desenvolvimento, as pesadas nuvens internas
vão embora e o vozerio internacional
desaparece. Devemos reagir um pouco às políticas do Fundo Monetário
Internacional e defender a empresa
nacional, esmagada na avalanche da
globalização. Sem crescimento, é o velho brocardo popular: "Em casa que
não tem pão, todos brigam e ninguém
tem razão".
José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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