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MARCELO BERABA
Sandro, Binguilim e Quiquito
RIO DE JANEIRO - Qual a diferença entre Sandro, Binguilim e Quiquito?
A história do Sandro todos conhecem. Foi abandonado pelos pais, passou a infância nas ruas, teve, por
poucos meses, o miserável conforto de
um lar adotivo, sobreviveu a chacinas. Um dia, aterrorizou nove reféns
dentro do ônibus 174 e matou uma
pessoa. Tinha 21 anos. Foi assassinado e enterrado como indigente.
Binguilim e Quiquito precisam ser
apresentados. Eles têm 14 anos. Quiquito é pequeno, não chega a um metro e meio. Binguilim é um pouco
maior, mas magro de desnutrição.
Ao contrário do Sandro, os dois têm
casas e famílias, embora não se possa
dizer que tenham lares. A mãe de um
deles e o padrasto estão presos por
tráfico de drogas.
Binguilim e Quiquito são da quadrilha do Remo, ligado ao Terceiro
Comando do narcotráfico e dono da
favela Final Feliz, na Pavuna, zona
norte do Rio. Como os mais velhos do
bando foram presos ou tiveram de fugir, os dois menores assumiram o comando dos negócios, até serem detidos nesta semana.
O que chama a atenção no caso é a
tarefa que eles tinham na divisão de
trabalho da quadrilha: eram os matadores. Teriam matado não apenas
traficantes rivais, mas trabalhadores
que moravam na favela. O bando financiava a compra da droga com a
venda de barracos tomados à força.
Os donos que resistiam eram mortos.
Pesquisa da assistente social Zilah
Vieira Meirelles em três morros do
Rio mostrou que o narcotráfico emprega 24% dos garotos de 10 a 19
anos. É um número chocante. A pesquisa mostra que eles procuram no
tráfico o que dificilmente obteriam
por outros caminhos: reconhecimento social e grana.
Na verdade, são muitas as diferenças entre a trajetória solitária e sem
referências dos meninos de rua, como
o Sandro, e a dos soldados do tráfico,
como Binguilim e Quiquito. Uns se
afundam na falta de perspectivas; os
outros se revigoram na crença da
onipotência. Mas acabam todos mortos e abandonados.
Uma derrota, para todos nós.
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