São Paulo, sexta-feira, 21 de julho de 2000


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MARCELO BERABA

Sandro, Binguilim e Quiquito

RIO DE JANEIRO - Qual a diferença entre Sandro, Binguilim e Quiquito?
A história do Sandro todos conhecem. Foi abandonado pelos pais, passou a infância nas ruas, teve, por poucos meses, o miserável conforto de um lar adotivo, sobreviveu a chacinas. Um dia, aterrorizou nove reféns dentro do ônibus 174 e matou uma pessoa. Tinha 21 anos. Foi assassinado e enterrado como indigente.
Binguilim e Quiquito precisam ser apresentados. Eles têm 14 anos. Quiquito é pequeno, não chega a um metro e meio. Binguilim é um pouco maior, mas magro de desnutrição.
Ao contrário do Sandro, os dois têm casas e famílias, embora não se possa dizer que tenham lares. A mãe de um deles e o padrasto estão presos por tráfico de drogas.
Binguilim e Quiquito são da quadrilha do Remo, ligado ao Terceiro Comando do narcotráfico e dono da favela Final Feliz, na Pavuna, zona norte do Rio. Como os mais velhos do bando foram presos ou tiveram de fugir, os dois menores assumiram o comando dos negócios, até serem detidos nesta semana.
O que chama a atenção no caso é a tarefa que eles tinham na divisão de trabalho da quadrilha: eram os matadores. Teriam matado não apenas traficantes rivais, mas trabalhadores que moravam na favela. O bando financiava a compra da droga com a venda de barracos tomados à força. Os donos que resistiam eram mortos.
Pesquisa da assistente social Zilah Vieira Meirelles em três morros do Rio mostrou que o narcotráfico emprega 24% dos garotos de 10 a 19 anos. É um número chocante. A pesquisa mostra que eles procuram no tráfico o que dificilmente obteriam por outros caminhos: reconhecimento social e grana.
Na verdade, são muitas as diferenças entre a trajetória solitária e sem referências dos meninos de rua, como o Sandro, e a dos soldados do tráfico, como Binguilim e Quiquito. Uns se afundam na falta de perspectivas; os outros se revigoram na crença da onipotência. Mas acabam todos mortos e abandonados.
Uma derrota, para todos nós.


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