São Paulo, Sábado, 21 de Agosto de 1999
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A recessão brasileira chegou ao fim?

SIM
O problema é a instabilidade

JULIO GOMES DE ALMEIDA

Tecnicamente, os indicadores mostram que a recessão que se iniciou em meados de 1998 chegou ao fim. O PIB já cresce há dois trimestres e as projeções indicam que a partir deste mês devemos voltar a ter crescimento positivo no setor que mais refletiu a crise: o industrial. As projeções apontam que o crescimento da produção industrial no terceiro trimestre de 1999 (com relação ao mesmo período do ano anterior) será baixo, porém o importante é que saia do vermelho, depois de uma sucessão de quedas tão expressivas quanto as de 2,5% a quase 5% nos quatro trimestres anteriores. As mesmas projeções indicam um crescimento maior para o último trimestre, ajudando para que no fechamento do ano o resultado seja uma variação possivelmente positiva (embora próxima de zero) da produção industrial. Ao lado do crescimento agrícola, são essas tendências que animam a previsão de que o PIB registre em 1999 um pequeno declínio ou um crescimento zero, contra estimativas muito mais adversas feitas no início do ano.
As principais condições para que um quadro de antecipações como o acima descrito venha a se concretizar são que a presente onda de instabilidade política não contamine as decisões empresariais e as dos consumidores, o que requer rápida resposta do governo, e que a política monetária mantenha sua orientação recente e não responda à presente instabilidade cambial elevando a taxa de juros. O aumento dos juros na atual situação não acabaria com a instabilidade e abortaria esse ensaio de recuperação da economia, o qual, embora esteja longe de indicar uma retomada fulgurante do crescimento, traz alento à produção e ao emprego, em um momento em que as expectativas se deterioram com rapidez e vão confirmando um quadro de pronunciado pessimismo.
O pessimismo é devido à deterioração do quadro político e social interno, não refletindo a capacidade de resistência do setor real da economia aos erros da política econômica. Reflete, sim, o desgaste e mesmo o cansaço provocado por um modelo econômico que, implantado já há cinco anos, na esteira da conquista da estabilização, sistematicamente negou valor à produção e deliberadamente encolheu os espaços de geração de renda, emprego, investimentos e exportações, ou seja, negou tudo o que, no final das contas, importa em uma economia que se quer atual, estável e aberta.
Se é assim, punir mais uma vez a produção e o emprego não é solução para esse quadro. Uma parcela da sua superação está no lado político, mas é necessário responder também no plano econômico, por meio de medidas que acenem com respostas relativamente rápidas e que, somadas ao (modesto) aumento previsto da produção, acenem com perspectiva de recuperação do emprego e maior crescimento.
Resistir a aumentar a taxa de juros, para o quanto antes dar continuidade à redução iniciada meses atrás; se necessário for, flexibilizar a política de intervenção do Banco Central no mercado cambial, para não referendar as exageradas expectativas altistas da cotação do dólar; formular um programa de combate ao desemprego e articular "para valer" um plano de incentivo às exportações, para simultaneamente estimular o crescimento interno e minimizar a instabilidade cambial; essas seriam respostas efetivas e simbolizariam o início da mudança do modelo econômico.


Julio Gomes de Almeida, 44, doutor em economia, é diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).



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