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A recessão brasileira chegou ao fim?
NÃO
Só no papel
PAULO YOKOTA
Os economistas acadêmicos são escravos da convenção. Segundo ela, se
por dois trimestres seguidos os indicadores do produto real apresentam decréscimo, caracteriza-se a recessão. Ao
contrário, não se registrando quedas, a
recessão acabou.
Os dados trimestrais do produto nacional divulgados pelo IBGE, eliminando as variações estacionais com
critérios pouco claros, indicam que no
terceiro trimestre de 1998 o produto
real da economia brasileira apresentou
uma queda de 0,92%. No quarto trimestre houve outra queda, de 1,76%,
sempre comparando com o trimestre
anterior, caracterizando uma recessão.
Mas os dados do primeiro trimestre
deste ano apresentaram um crescimento de 0,78%, e os do segundo trimestre, um novo crescimento de
0,93%, dando margem para a avaliação de muitos economistas de que a
recessão é coisa do passado.
Com base nesses e em outros dados,
muitos analistas estão indicando que o
segundo semestre do ano pode ser
promissor, permitindo que em 1999 o
produto real apresente um decréscimo
modesto comparado com o do ano
passado e com os prognósticos do próprio governo no início do ano, que
eram desastrosos. Tecnicamente, as
estimativas dos produtos apresentam
variância elevada, que só permitem
afirmações dentro de um intervalo de
confiança muito amplo, que vai dos
dados positivos aos negativos.
Já houve quem dissesse que a estatística pode ser apresentada de forma
conveniente. Se os mesmos dados forem examinados em comparação com
os trimestres correspondentes do ano
passado, vai-se constatar que a economia brasileira continua decrescendo e,
no máximo, poderá estabilizar-se num
patamar muito baixo. Ou seja, o consolo é que a recessão não está se aprofundando.
Existem muitas dúvidas metodológicas sobre esses dados elaborados pelo
IBGE. O produto que afirmam ter
crescido é o da agropecuária. Comparando o pico da safra com a entressafra, a estimativa seria de um assombroso crescimento em torno de 18%,
que deixa dúvidas sobre os critérios de
eliminação da sazonalidade. A lavoura
teria contribuído com um crescimento
próximo de 30%, com base em dados
preliminares de safra.
Quem tem alguma vivência da economia brasileira sabe que a simples
quantidade da produção de grãos não
é um bom indicador. Em termos da
renda real proporcionada ao setor rural, o resultado foi negativo, pois o
crescimento relevante foi o do milho,
em detrimento, em parte, da soja. Isso
porque o mesmo hectare de soja equivale a um múltiplo de milho, em toneladas, mas não em renda.
Da análise de um longo período do
país é possível constatar que uma safra
agrícola realmente boa gera uma grande demanda de produtos industriais e
de serviços, proporcionando um formidável estímulo para o segundo semestre em toda a economia. Registra-se, normalmente, uma euforia que não
se está observando hoje. Pelo contrário, o desânimo no meio rural está ampliando os atuais protestos, e as estimativas dos especialistas são de uma
queda na próxima área cultivada.
As estimativas relacionadas aos serviços também são precárias. Por
exemplo, os aluguéis de imóveis estão
apresentando crescimentos estáveis de
0,52% nos últimos quatro trimestres,
quando salta aos olhos que imóveis desocupados estão aumentando e que os
aluguéis estão em queda nominal.
É preciso muita torcida e fé para afirmar que já saímos da recessão. A sensação dos que estão mais ligados à produção é que continuamos no fundo do
poço, com agravamento do quadro
político, que tem reflexos no câmbio.
Paulo Yokota, 60, economista, é professor aposentado da Faculdade de Economia e Administração da
USP (Universidade de São Paulo). Foi presidente do
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(1979 a 85) e diretor do Banco Central (1971 a 74).
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