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RUY CASTRO
Zumbis na passarela
RIO DE JANEIRO - Quando se
imaginava que a morte por inanição
de duas ou três modelos brasileiras
iria restabelecer o primado de mulheres minimamente saudáveis nas
passarelas, as semanas de moda em
São Paulo e no Rio voltaram a apresentar o costumeiro desfile de "grotesqueries", a ponto de alguns na
plateia se perguntarem se esta ou
aquela menina não estaria doente.
A resposta é: "Claro que está".
Se a média de idade das atuais
modelos for de 20 anos, significa
que elas tinham menos de 15 quando trocaram suas quatro refeições
diárias por uma dieta de água, café e
cigarros para ficar no peso ideal para estilistas e agências. Considerando-se que ainda estavam em fase de
crescimento quando aderiram a esse ritual macabro, não admira que
seu índice de massa corporal, avaliado pela Folha, seja igual ao de
uma criança.
Há muito me convenci de que o
sonho dos criadores de moda era
ter como modelo o zumbi Cesare,
interpretado por Conrad Veidt, no
filme de Robert Wiene, "O Gabinete do Dr. Caligari", de 1920. Ele era
magérrimo, tinha cabelos pretos
escorridos e úmidos, grandes olheiras, beiços de batom escuro e usava
uma malha preta inteiriça que lhe
realçava os braços e pernas de graveto. A diferença para com as modelos de hoje é que Cesare se vestia
melhor.
E essa é a contradição. Talvez eu
não frequente os ambientes certos,
mas não vejo as "criações" exibidas
na passarela se transferirem para
as ruas. Nem poderiam. Como imaginar que roupas criadas para menores de 50 kg se adaptem às mulheres da vida real, cujo dia a dia se
compõe de cachorro quente, batata
frita e torta de brigadeiro?
Ou talvez o mundo da moda seja
apenas uma outra forma de teatro,
em que -ao contrário deste, que
retrata a vida- as pessoas se vistam
a caráter para morrer.
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