São Paulo, quarta-feira, 22 de maio de 2002

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DESAFINADA

Um ruído estranho emana da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo. Ele é emitido pelo contrato que estabelece para o maestro da Orquestra Sinfônica do Estado (Osesp), John Neschling, rendimentos anuais da ordem de US$ 400 mil.
É preciso registrar que, desde que Neschling assumiu a sinfônica, em 1997, ela deu um incrível salto qualitativo. Nas palavras de Arthur Nestrovski, crítico musical desta Folha, a Osesp não é apenas a melhor orquestra brasileira, mas a melhor que o Brasil jamais teve, alcançando padrões internacionais de excelência.
É evidente que tamanho sucesso tem um preço. Os US$ 400 mil estão em patamar inferior ao que recebem outros maestros de nível internacional. Regentes das mais importantes orquestras do mundo ganham bem mais, chegando à casa dos milhões.
O problema com o contrato de Neschling é que a Secretaria da Cultura procurava mantê-lo sob sigilo, o que contraria as mais elementares normas da administração pública. É inaceitável a tese do secretário Marcos Mendonça de que a divulgação dos rendimentos do maestro fere o artigo 5º Constituição, que estabelece o direito à privacidade.
A prevalecer essa interpretação, os vencimentos de juízes, generais e o do próprio secretário seriam sigilosos; o salário do presidente seria um segredo de Estado. Quando se trata de pagamentos feitos com recursos públicos, predomina o princípio da publicidade dos atos do Estado.
Se um trabalhador do setor privado não deseja divulgar quanto ganha, exerce um direito seu. Mas o poder público, quando paga, tem o dever de informar quanto, exceto em raríssimas situações que envolvem questões de segurança nacional. E parece improvável que a divulgação dos rendimentos de Neschling ameace os alicerces da República.
É digno de louvor o trabalho desenvolvido pela secretaria e por Nesch ling com a Osesp. Mas é lamentável que a incúria administrativa destoe do sucesso da orquestra.


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