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CARLOS HEITOR CONY
A Copa e a vacina
RIO DE JANEIRO - Vi a foto de Ronaldo, manga da camisa suspensa, sendo vacinado para poder disputar a
Copa no outro lado do mundo. Nada
de mais um cara ser vacinado contra
isso ou aquilo. Eu próprio fui vacinado diversas vezes. Só não consegui
que me vacinassem contra a burrice,
a intolerância e outros males crônicos ou endêmicos que ameaçam a
nossa espécie.
Em 1998, não precisei ser vacinado
contra nada para ir à França participar da cobertura da Copa. Neste ano,
almoçava com o Arthur Xexéo quando, de repente, ele se levantou e declarou que precisava ir a um posto de
saúde para ser vacinado, tal como
Ronaldo. Os orientais, que patrocinam a Copa, temem alguma coisa
parecida com a doença da vaca louca
e obrigam os forasteiros a apresentar
o atestado de que estão sadios e de
que não causarão estragos na Coréia
do Sul e no Japão.
Lembro a ida de uma comitiva de
escritores à China. Mal o avião pousou em Pequim, um oficial entrou a
bordo e pediu o atestado contra a febre amarela a todos os ocidentais que
chegavam. Dinah Silveira de Queiroz
perdera o atestado, que deveria estar
anexado ao passaporte.
Abriu a bolsa e procurou, procurou,
até que encontrou um talão da loteria esportiva. Passou-o ao oficial, que
o examinou atentamente, revirou-o
de todos os lados, até que o colocou
de cabeça para baixo e aí então entendeu tudo.
Sorriu para Dinah, pediu desculpa
pela desconfiança inicial e carimbou
o passaporte dela, dando-a como
inofensiva aos concidadãos de Mao
Tse-tung, que era então o guia genial
dos povos de plantão.
Tivemos uma revolução, aqui no
Rio, contra a lei da vacina obrigatória. Oswaldo Cruz foi considerado
um criminoso, um genocida que invadia a privacidade humana com
suas agulhas saneadoras. Não chego
a tanto, mas sinto um bruto alívio
quando não me obrigam a nada,
nem mesmo a ser mais sadio.
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