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ROBERTO MANGABEIRA UNGER
A obra
Pensar pequeno parece hoje no
Brasil marca de realismo. Pensar
pequeno, porém, é incompatível com
as iniciativas necessárias para soerguer o país. Proponho dois raciocínios
que convergem para o mesmo desfecho.
As renovações mais bem-sucedidas
do século passado ocorreram na Europa sob o nome de social-democracia e nos Estados Unidos sob a égide
do "New Deal" de Roosevelt. A experiência do "New Deal" é exemplar tanto pelo que se fez quanto pelo que se deixou de fazer. Garantiu os americanos contra os extremos da insegurança social produzida pela instabilidade econômica. De nada teria adiantado o
compromisso social, porém, sem a recuperação econômica. E o que recuperou a economia americana, dobrando o PIB em quatro anos, não foi
qualquer política econômica. Foi a
guerra. A mobilização guerreira dos
recursos nacionais juntou-se à socialização seletiva da economia para democratizar e desenvolver o país. Não temos guerras à vista. Bastaria essa diferença para demonstrar a impropriedade de uma estratégia nacional que se contente em imitar a social-democracia dos países ricos. Daí por que me
venho batendo por um projeto que ao
mesmo tempo mobilize os recursos
nacionais -economia de guerra sem
guerra- e ancore o compromisso social na democratização das oportunidades para estudar, trabalhar e produzir.
O segundo raciocínio vai na mesma
direção. Em quais dos países latino-americanos teria o neoliberalismo -a
imitação das instituições da economia
de mercado dos países ricos e sobretudo dos Estados Unidos- os maiores
benefícios e as menores desvantagens?
A resposta paradoxal é: Costa Rica e
Cuba, dois pequenos países tornados
mais igualitários, num caso por um
capitalismo pequeno-burguês e, no
outro, por um estatismo despótico. E
em quais seria a orientação neoliberal
mais prejudicial e ineficaz? Nas nações
latino-americanas maiores e mais desiguais -o Brasil e o México. Nesses
países, a orientação neoliberal predominante continuará a ser o que é agora: o rótulo de nova divisão social, excluindo a maioria da população de capacitações e de acessos. A economia
de mercado não cria seus próprios
pressupostos. Floresce em ambiente
marcado por descentralização de
oportunidades de estudo e trabalho e
pela atuação de um Estado relativamente independente de influências
plutocráticas. O mercado é impotente
para preencher seus próprios requisitos; num quadro de grandes desigualdades, precisa ser reinventado, em sua forma institucional, para poder, de fato, existir para a maioria. É por isso
que luto por um projeto que democratize a economia de mercado entre nós
e construa as bases desse mercado democratizado: instituições econômicas
que associem o Estado e a iniciativa
privada para vencer as inibições do
atraso e multiplicar acessos a crédito,
tecnologia e conhecimento; instituições políticas que inaugurem democracia de alta energia, capaz de romper os vínculos entre o poder e o dinheiro, estimular o engajamento cívico e facilitar as mudanças estruturais; ensino analítico e capacitador, que dê
braços e asas a nosso engenho.
O maior obstáculo ao avanço dessa
campanha transformadora não é econômico nem político. É a idéia apequenada que fazemos de nós mesmos.
Destruir essa idéia e substituí-la por
outra, de grandeza, é nossa tarefa e
minha obsessão.
Roberto Mangabeira Unger escreve às terças-feiras nesta coluna.
www.law.harvard.edu/unger
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