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CLÓVIS ROSSI
O exílio está de volta
SÃO PAULO - Deu em "O Estado de S. Paulo" de ontem: "O comerciante
brasileiro Saleh Hage ganhou asilo
político nos Estados Unidos, dia 4, dizendo-se vítima da violência em São
Paulo".
Prossegue o texto: "Só este ano, ele
testemunhou seis assaltos a vizinhos
na zona leste e foi ameaçado pelos
criminosos. Segundo o Serviço Nacional de Imigração americano, "ele parecia sincero ao revelar seu medo de
continuar no Brasil'".
É inacreditável, mas verdadeiro: 17
anos depois da restauração da democracia, o país volta a ter pelo menos
um asilado político. E o termo, no caso, não é exagerado: o Brasil vive um
estado de guerra civil não declarada,
e vítimas de guerras civis são sempre
asilados políticos.
É razoável imaginar que muitos
outros brasileiros, se pudessem, tomariam atitude idêntica à de Saleh
Hage. Eu mesmo o faria, ainda que
não tenha testemunhado assaltos recentemente. Mas é cada vez mais difícil suportar a roleta-russa diária
que é viver em São Paulo, um fenômeno sobre o qual você não tem controle nenhum.
Se ainda houvesse parâmetros, vá
lá. Se eu soubesse que ir ao bairro x
ou y, ou andar na rua depois de tal
hora etc. me torna mais suscetível de
ser vítima da violência urbana, trataria de não fazer essas coisas, mesmo à custa de aceitar uma limitação
no meu direito de ir e vir.
É como fumar. Você sabe que aumenta as chances de contrair câncer
e, portanto, deve ser evitado.
Mas, no caso da violência, não há
regras. A próxima bala, em qualquer
esquina ou mesmo dentro de casa,
pode ser a sua ou a de um parente
muito próximo.
Espero que, ao tomar conhecimento do pedido de asilo de Saleh Hage,
um dos responsáveis pela segurança
pública no país, o general Alberto
Cardoso, reformule a sua já grave
afirmação de que o país está chegando, em matéria de violência, ao ponto de não-retorno.
Já chegou, general. E o país já cansou de diagnósticos. Cadê a ação?
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