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São Paulo, sábado, 22 de novembro de 2003

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LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

Idade penal

Temos de nos unir com solidariedade e profunda dor aos familiares que sofrem por causa de crime cometido por menores, de modo covarde e inaceitável. Diante do crime, a primeira atenção é para as vítimas do ato perverso.
Coloca-se em questão o problema mais amplo das agressões e violência na sociedade, cujas raízes mergulham nas graves injustiças sociais e, em especial, nas deficiências do ambiente familiar e do sistema educativo.
É nesse contexto que se tem explicitado o debate sobre a maioridade penal. Alguns questionam o Estatuto da Criança e do Adolescente, quando, à luz do artigo 228 da Constituição, estabelece que "são pessoalmente inimputáveis os menores de 18 anos, sujeitos às normas da legislação especial", e afirmam que a responsabilidade penal deveria iniciar-se aos 16 anos. Há uma série de elementos que devem ser considerados com isenção e prudência.
1. O aumento da violência exige um empenho de toda a sociedade para enfrentar as disparidades econômicas, o tráfico de drogas e a formação de quadrilhas.
2. Requer-se a imediata renovação do sistema penitenciário, que, em vez de oferecer condições de recuperação, fomenta a violência na própria prisão e prepara outros crimes.
3. A atual legislação brasileira, que estabelece a idade de 18 anos para imputabilidade penal, está de acordo com a convenção da ONU sobre os direitos da criança, aprovada pelo Brasil e por mais de 170 países.
4. O ECA prevê medidas socioeducativas, punitivas e até a perda de liberdade no caso de menor com desequilíbrios ou graves falhas de personalidade. Quando a privação da liberdade é necessária, requer-se não só ambiente de total segurança mas adequado tratamento e reeducação. Lançar o menor nos cárceres de adultos só poderia corrompê-lo mais.
5. O estatuto é uma conquista da sociedade brasileira que tem trazido notáveis benefícios. Serve de exemplo o Núcleo de Atendimento Integral de São Carlos (SP), que, reeducando os menores, reduziu em mais da metade a incidência de roubos e outros atos infracionários.
6. Urgente, portanto, é o cumprimento correto do ECA com recursos e investimentos adequados. Temos de superar as medidas meramente repressivas e até vingativas por meio de um esforço coletivo da sociedade para assumir uma atitude pedagógica que procure recuperar os menores que cometem atos infracionários graves.
7. A proposta de modificar a maioridade penal para 16 anos, nas poucas nações em que foi aplicada, não reduziu a violência nem a criminalidade. O país que opta pela redução denota estar mais interessado em se defender "contra o menor" do que em ajudá-lo a se recuperar e a fazer o bem e parece desconhecer a própria responsabilidade na prevenção de atos infracionários.
8. As políticas públicas precisam assegurar programas de apoio à família, capacitação profissional e aumento de empregos que abram horizontes para a juventude poder viver e trabalhar.
O mais importante em relação à idade penal é a atitude da sociedade, que deve estar preparada para acompanhar, com amor e paciência, a juventude em situação de risco, ajudando-a a exercitar a dignidade própria dos filhos de Deus e a plena cidadania.


Dom Luciano Mendes de Almeida escreve aos sábados nesta coluna.


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