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TENDÊNCIAS/DEBATES
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É positivo o projeto de lei que autoriza o uso da videoconferência em interrogatórios?
NÃO
Além dos limites da legalidade
LUIZ FLÁVIO BORGES D'URSO
A INCORPORAÇÃO dos avanços
tecnológicos por parte da Justiça é sempre bem-vinda, mas
esse avanço não pode suprimir direitos, sobrepondo-se às garantias constitucionais dos cidadãos e ao devido
processo legal.
Dessa forma, o Supremo Tribunal
Federal, em decisão acertada, reconheceu a inconstitucionalidade da lei
paulista nº 11.819/05, que previa a
realização de interrogatórios por videoconferências, quer porque tal normatização é de competência federal,
quer porque tal prática viola a Lei
Maior em vigor.
Assim, para atender ao interesse
geral de não onerar o Estado com escoltas policiais, que, além de dispendiosas, representam sempre um risco
de fuga, e no interesse da segurança
de todos é que defendemos que o juiz
compareça à unidade prisional para
realizar o interrogatório, o que, inclusive, atende ao que determina a lei e
não gerará gastos com aparelhos de
videoconferência.
Recentemente, a Comissão de
Constituição e Justiça do Senado
aprovou projeto de lei que autoriza o
emprego da videoconferência em casos excepcionais, ou seja, na audiência de presos de alta periculosidade e
quando houver dificuldade para comparecimento do acusado em juízo. Essa manobra para viabilizar parcialmente a videoconferência é igualmente inaceitável.
A lei é igual para todos. Não podemos admitir exceção dentro do Estado democrático de Direito. O acusado, independente do crime que tenha
cometido, detêm direitos constitucionais que precisam ser observados,
como a ampla defesa, o contraditório
e -inclusive- estar pessoalmente
perante o juiz no interrogatório.
A videoconferência limita o direito
de defesa do preso porque impede
que o acusado se coloque pessoalmente diante de seu julgador. O contato pessoal é fundamental para a formação do convencimento do magistrado, incidindo até mesmo sobre um
pedido de liberdade provisória.
Diante de uma câmera, dentro de
uma unidade prisional, o acusado certamente ficará intimidado a falar ou
fazer denúncias de qualquer natureza, como coação ou maus-tratos que
esteja sofrendo.
O interrogatório é um momento
importantíssimo para a defesa no
processo penal, pois estabelece a única oportunidade de o acusado falar de
viva voz ao juiz da causa.
Um magistrado, ao interrogar um
preso, não está apenas captando suas
respostas verbais, mas analisando toda a sua linguagem corporal e suas
reações para formar sua convicção
para aquele momento processual.
O réu pode até silenciar, mas esse
momento é muito importante porque
é o único no qual fala ao juiz. Em nenhum outro momento lhe será conferida a palavra.
Todos nós queremos modernizar a
Justiça, mas isso não pode ser feito
ultrapassando-se os limites da legalidade. Se o grande problema reside na
necessidade de economizar recursos
públicos e assegurar segurança, tal
ato deve ocorrer sem ferir os direitos
do cidadão, bastando que o juiz vá ao
presídio.
Evidentemente, o juiz não irá até a
cela, mas na administração do presídio, com a presença do advogado e do
promotor, em total segurança, colher
os depoimentos.
Considero isso uma obrigação do
juiz, que tem o dever de fiscalizar as
condições carcerárias. Alguns juízes
já procedem assim e, em uma única
manhã, realizam dez interrogatórios,
agilizando o andamento dos processos, sem custos para o erário.
LUIZ FLÁVIO BORGES D'URSO, advogado criminalista,
mestre e doutor pela USP, é presidente da OAB-SP (seccional paulista do Ordem dos Advogados do Brasil).
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