São Paulo, segunda-feira, 22 de novembro de 2010

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Mudar, mas não agora

Governadores têm bons argumentos para pedir mudança do indexador das dívidas com a União, mas o mais sensato é esperar

A renegociação da dívida dos Estados e a promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal no governo Fernando Henrique Cardoso foram marcos no longo processo de construção da estabilidade econômica do país. São conquistas que precisam ser aperfeiçoadas e preservadas de qualquer risco de retrocesso, especialmente no contexto atual da economia brasileira, em que é clara a necessidade de um novo equilíbrio na política econômica, com maior atenção à disciplina fiscal.
Por isso, a demanda de alguns governadores eleitos de mudar a taxa de juros que incide sobre as dívidas renegociadas em 1998 deve ser vista com cautela. Trata-se de reivindicação sazonal, que vem à baila após as eleições. Até o momento não frutificou pelo temor do governo federal de que qualquer flexibilidade nesse tema, por mínima que seja, possa abrir a caixa de Pandora da irresponsabilidade orçamentária.
A queixa dos governadores está no indexador da dívida, que, na maioria dos casos, segue a variação do IGP-DI (Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna) mais uma taxa de juros de 6% ao ano. Os Estados comprometem até 13% da receita para o pagamento. É verdade que quando há forte alta do índice -como neste ano, em que deve variar 10%- o ônus pode ser tornar excessivo, não em termos de despesa corrente, pois o comprometimento máximo anual das receitas não muda, mas pelo aumento da dívida. Com efeito, o estoque de créditos da União contra os Estados, de 11,3% do PIB, é praticamente o mesmo de 1999, apesar do esforço dos governos estaduais no período.
Não há dúvida também de que o IGP-DI é por demais sensível a oscilações, pois reflete a variação da taxa de câmbio. Isso provoca um descasamento em relação às receitas dos Estados, que tendem a seguir mais de perto o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), que mede a inflação oficial.
Entre 1997 e 2009 o IGP-DI acumulou uma alta de 196%, contra 121% do IPCA. É uma comparação que dá razão aos governadores. Por outro lado, a dívida dos Estados era muito mais cara antes da renegociação e naquele momento União subsidiou a troca, com impacto em suas finanças.
Por fim, além das questões políticas e técnicas, há os impedimentos jurídicos. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, argumenta que a Lei de Responsabilidade Fiscal, em seu artigo 35, proíbe a mudança. Seria necessário alterar a lei para fazer a troca de indexador. O risco de perda de controle neste processo é alto.
Apesar de justas queixas dos governadores quanto aos custos futuros da dívida -que podem se tornar excessivos especialmente se a taxa Selic continuar a cair- o momento atual de transição de governo não recomenda que se mexa com este assunto.
O mais sensato é esperar. Depois de definida a política econômica do governo Dilma Rousseff e encaminhada sua agenda fiscal -especula-se sobre a possibilidade de zerar o deficit nominal até 2014, mas ainda não está claro o que realmente pensa a presidente eleita- poderá ser do interesse nacional revisitar o tema e abolir o próprio IGP-DI.



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