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São Paulo, domingo, 23 de fevereiro de 2003

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GIGANTE FRÁGIL

Os indicadores econômicos mais recentes confirmam um cenário de fragilidade na principal economia do mundo.
Os impasses fiscais, financeiros e produtivos acumulam-se com intensidade e velocidade proporcionais ao tamanho do gigante econômico global, que, sem previsão de retomada, patina em uma das mais graves crises econômicas de sua história.
A inflação no atacado bateu um recorde de 13 anos. Os pedidos de seguro-desemprego voltaram a crescer. O déficit do país em suas transações com o exterior registrou o pior resultado de todos os tempos. E os "leading indicators", que procuram capturar as tendências da economia, mostram o nível mais intenso de pessimismo com relação ao futuro desde setembro do ano passado.
Instabilidade torna-se a cada dia uma palavra insuficiente para definir o cenário de crise aberta, com tendência à estagnação e crise nas principais economias do mundo, mas principalmente nos EUA.
A resposta republicana é conhecida: cortar impostos para estimular uma retomada animada pelo setor privado. Mas o temor diante do déficit público crescente deprime expectativas. O dólar perdeu 15% de seu valor em relação ao euro nos últimos 12 meses. A alta do petróleo traz inflação aos Estados Unidos.
Para combater essa inflação, a alta de juros é absolutamente inócua, pois não se trata de conter a demanda ou os investimentos -ao contrário, há muita capacidade ociosa.
Mas o presidente do banco central dos EUA, Alan Greenspan, já enfrenta pressões para que defenda o país contra a inflação subindo os juros.
Há o perigo maior de uma estagflação, ou seja, estagnação da atividade econômica somada a uma inflação de custos causada pela instabilidade internacional. Mas, em muitos setores, por enquanto, o que predomina é o medo da deflação prolongada.
Talvez haja mesmo pouca coisa a fazer em termos de política econômica. Essa perplexidade é o aspecto mais inquietante do cenário atual.
Trata-se de uma crise de proporções globais que ignora os mais variados pacotes fiscais e monetários adotados isoladamente por governos -nos EUA, no Japão ou na UE.
Tanto no Japão quanto nos EUA, ocorreu, a partir do final dos anos 90, o estouro sucessivo de gigantescas bolhas especulativas nos mercados financeiros e imobiliários.
A desvalorização de ativos, ações e dívidas bancárias resulta do desabamento do castelo de cartas da acumulação de capitais fictícios.
Dívidas públicas giraram nessa fantasia, especialmente as de países pobres ou muito dependentes de capitais externos, como o Brasil.
Não há nada ou ninguém capaz de alterar os ânimos depressivos acentuados pela enorme destruição de riqueza. Nem cortes de impostos.
O desvendamento de uma intricada rede de interesses na publicação de informação financeira fraudulenta envolvendo reguladores, executivos de empresas, rodas da alta finança global e autoridades do governo torna a perda de confiança no futuro ainda mais entranhada.
A invasão do Iraque poderia ser interpretada como tentativa de insuflar o moral nacional norte-americano e de quebra injetar algum gasto público para animar setores estratégicos. A proporção da crise econômica dos EUA, no entanto, torna até ridícula essa possibilidade tal o peso da tendência à depressão econômica.
O gigante econômico e militar mundial mostra pés de barro.



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