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São Paulo, domingo, 23 de fevereiro de 2003

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NUMA FRIA

O aumento no consumo de bebidas "ice", produtos industrializados que misturam álcool com sucos de frutas, refrigerantes ou água, vem causando preocupação entre especialistas em alcoolismo. É que os "ices" disfarçam o sabor característico das bebidas alcoólicas tradicionais tornando-se especialmente agradáveis ao paladar juvenil.
O temor é o de que a chegada maciça desses produtos ao mercado leve pessoas mais jovens a iniciar-se no hábito de consumir álcool. E existem muitos trabalhos científicos que mostram uma forte correlação entre o desenvolvimento de dependência química e a idade precoce com que se comece a beber.
Não se trata, é claro, de proibir os "ices", ainda que se suspeite que eles visem principalmente ao público juvenil, que, em tese, não deveria beber. Mas é preciso pelo menos estar atento para que os fabricantes não lancem agressivas campanhas de marketing para capturar os jovens, como vem ocorrendo. A cidade de São Paulo, por exemplo, está repleta de outdoors anunciando "ices". E a televisão exibe muito amiúde propagandas desses produtos.
A lei que trata da publicidade de produtos nocivos à saúde, a 9.294/ 96, é um pequeno escândalo. Para começar, ela não considera alcoólicas as bebidas com graduação inferior a 13 graus Gay Lussac. Assim, cervejas, a maioria dos vinhos e os "ices" estão excluídos das regras que se aplicam às demais bebidas alcoólicas. Podem ser anunciados livremente na TV e no rádio sem se sujeitar nem mesmo às restrições de horário que existem para uísques e aguardentes. Pior, a esses produtos não se aplica nem mesmo o dispositivo que veda sua associação "a esporte olímpico ou de competição, ao desempenho saudável de qualquer atividade, à condução de veículos e a imagens ou idéias de maior êxito ou sexualidade das pessoas".
É evidente que essa estranha legislação não encontra amparo em nenhum trabalho científico conhecido nem nas regras do mais elementar bom senso. Parece mais lógico acreditar que ela seja fruto de algum lobby poderoso no Congresso.
A mesma 9.294 já foi emendada em 2000 para abrigar um controle mais efetivo da propaganda de cigarros. Não existe razão para não fazer o mesmo em relação às bebidas alcoólicas. Ambos são produtos legais cujo consumo é permitido no país. Isso não significa que sua utilização deva ser incentivada através de mensagens enganosas que procuram ludibriar os mais jovens. O dever do poder público, nesses casos, é alertar para os riscos associados ao abuso, que existem e não são desprezíveis.



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