São Paulo, domingo, 23 de maio de 2004

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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES

Brasil e China: um contraste a ser analisado

A missão brasileira chega à China no momento em que esse país tenciona desacelerar o seu crescimento. Terá sido um erro de "timing" para as pretensões brasileiras exportar e vender mais para o "gigante acordado"? Tudo depende de como será feita a desaceleração.
A China vai reduzir a atual taxa de crescimento de 9,7% ao ano para 2% ou 3% ou descerá lentamente para taxas de 7% ou 8%?
No primeiro caso, o Brasil teria perdido sua grande oportunidade de comercializar com o continente chinês. Mais grave, junto com o Brasil teríamos uma derrocada do planeta Terra, uma vez que a China responde, atualmente, por mais de um terço do crescimento mundial ("The Great Fall of China?", "The Economist", 15/5).
No segundo caso, o gigante econômico continuaria sendo um grande celeiro para a venda de nossas commodities e até mesmo para alguns manufaturados ou semimanufaturados.
O que acontecerá? A China está procurando usar os instrumentos convencionais para desaquecer a sua economia, a saber: aumento da taxa de juros, restrição de crédito, esfriamento da demanda e cortes de obras públicas.
Os analistas consideram que tais medidas serão ineficazes no caso chinês, porque a grande maioria de empresas estatais independe de crédito de mercado -recebem recursos do governo- e a demanda dos consumidores ainda é muito baixa, não havendo espaço para cortar mais.
Resta, assim, a contração das obras do governo central e das províncias. Mas, mesmo aí, os governantes não vão paralisar os grandes projetos que estão em andamento. Os cortes deverão incidir em obras não iniciadas, o que terá um efeito lento na pretendida desaceleração.
Como se vê, a economia chinesa tem sérias dificuldades para parar de crescer, enquanto a nossa tem dificuldades para voltar a crescer. Estaria aí uma complementaridade?
Na China, a hipótese mais provável é a de um pouso suave. Nesse caso, haveria queda no preço das commodities que exportamos. Mas o volume continuaria grande, podendo até aumentar.
O importante é consolidarmos uma posição de exportadores de grande porte para China. Pode-se perder um pouco no preço hoje para conquistar um grande mercado amanhã e fazer subir os preços quando a economia chinesa voltar a crescer no ritmo das últimas décadas.
Ademais, podemos minimizar as perdas da queda dos preços se fizermos a nossa própria lição de casa, barateando tudo o que onera demais a nossa produção, começando pela excessiva carga tributária, passando pela grossa burocracia e pelos portos atravancados e terminando pela rigidez de nosso quadro legal em vários campos, dentre eles, o ambiente, a regulação e a contratação do trabalho.
Oxalá a missão brasileira volte da China com boas notícias, ainda que sejam de médio e longo prazo.


Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.


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