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TENDÊNCIAS/DEBATES
O Conselho Monetário Nacional deve reduzir a meta de inflação para 2009?
NÃO
Muito barulho por pouca coisa
FERNANDO CARDIM DE CARVALHO
A NÓS brasileiros, especialmente aqueles que vivemos os tempos da alta inflação dos anos 70
ao Plano Real, qualquer iniciativa que
se anuncie como mais um reforço da
estabilidade alcançada a partir de
1994 tende a ser apoiada, até por reflexo. Agora se anuncia que o presidente do Banco Central e o ministro
do Planejamento, dois terços portanto do Conselho Monetário Nacional,
querem reduzir a meta de inflação para os próximos anos. A isso se opõem
o ministro da Fazenda e, pelo que disse ao jornal "Valor" de quinta-feira, o
presidente Lula. O ministro Mantega
e o presidente têm razão.
A taxa de inflação está em menos de
4% ao ano. A meta de inflação está fixada um pouco acima disso. Vale a pena buscar reduzir mais o ritmo de alta
de preços? Talvez valesse, se as políticas necessárias para conseguir isso
não implicassem nenhum custo.
Mas o instrumento de que dispõe o
BC para reduzir a taxa de inflação é a
elevação ou a manutenção da taxa de
juros em níveis suficientemente elevados para reprimir a demanda de
consumidores e investidores. Há um
custo direto resultante da adoção
dessa política, que é a manutenção
das taxas de crescimento econômico
em níveis medíocres, e vários indiretos, como a valorização persistente do
real, que tanto está custando ao setor
industrial brasileiro.
Por que a inflação é um problema?
Quando há um aumento suficientemente generalizado de preços para
que se possa falar de inflação, sempre
se observa que alguns preços sobem
mais do que a média e outros sobem
menos. Os setores em que os preços
sobem mais tendem a melhorar sua
posição em relação àqueles em que os
preços sobem menos, porque os produtos cujos preços sobem mais depressa se trocam por maiores quantidades dos produtos que crescem menos. A inflação é um problema porque
ela se constitui em um mecanismo de
distribuição de renda que atua de forma cega, favorecendo de forma perversa aqueles empresários mais ágeis
no reajuste de seus preços. Não ocorresse essa redistribuição, a inflação
seria inteiramente inócua, independentemente da taxa alcançada.
Logo, a inflação é um problema.
Mas a inflação nos níveis atuais é um
"sério" problema? A resposta é certamente não. Outros fatores atuam no
sentido de redistribuir inesperadamente renda o tempo todo.
A inflação que vivemos até 1994 era
um grave problema. Se a inflação é de
100% e um empresário só aumenta
seus preços (ou os trabalhadores, os
seus salários) metade disso, há uma
perda real significativa. Se, em contraste, a inflação anual é de 5% e ocorre a mesma defasagem, perde-se só
2,5%, compensável com relativa facilidade por outras medidas, como aumentos de produtividade.
A inflação deixa de ser problema sério quando sua dimensão a torna apenas mais um dos muitos fatores que
determinam o sucesso de uma atividade. Simplesmente o ganho com a
redução ulterior da taxa de inflação
não vale o custo representado pela
manutenção de taxas de juros mais
altas do que poderia ser o caso. A perda de bem-estar gerada pela incapacidade da economia de gerar empregos
é muito maior que o ganho de evitar a
perda de renda real por ter uma inflação de 4%, e não 3% ou menos.
O problema mais sério está no próprio regime de política monetária
atualmente em prática, caracterizado
pela insensibilidade aos efeitos contracionistas que exerce sobre o produto e o emprego. Um BC que despreza os efeitos de suas políticas sobre a
produção, o emprego, as exportações
sob a alegação de que seu papel é apenas controlar a inflação é um obstáculo ao desenvolvimento, não um apoio.
Alan Greenspan, o lendário líder do
banco central mais bem-sucedido da
atualidade, o Federal Reserve, bloqueou, com sua decidida oposição, todas as tentativas do Congresso norte-americano de impor à instituição um
regime de metas inflacionárias. O
atual presidente do Fed, Ben Bernanke, que defendeu esse regime quando
estava na academia, não fez movimentos nessa direção após assumir o
posto atual. Há aí uma lição importante. Perder tempo discutindo uma
redução da meta inflacionária, por
outro lado, é latir na árvore errada.
FERNANDO J. CARDIM DE CARVALHO, 53, doutor em
economia pela Universidade Rutgers (EUA), é professor
titular do Instituto de Economia da UFRJ (Universidade
Federal do Rio de Janeiro).
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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