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TENDÊNCIAS/DEBATES
O Conselho Monetário Nacional deve reduzir a meta de inflação para 2009?
SIM
Redução não traz riscos ao crescimento
PAULO TENANI
JÁ FAZ oito anos que o regime de
metas de inflação foi formalmente
instituído no Brasil, com o objetivo de prover os agentes econômicos
com uma nova âncora monetária, que
substituísse aquela abandonada durante a desvalorização do real.
Já de início, as metas foram fixadas
em patamares altos -8% em 1999,
6% em 2000, 4% em 2001. Tais metas
refletiam a complicada realidade brasileira de então. O país estava em pleno processo de absorção de um violento choque de preços relativos que
tornava irreal qualquer cenário de inflação baixa. E pouco antes o Brasil
convivia com taxas de inflação superiores a 2.500% ao ano, o que tornava
a memória inflacionária forte, e a
convergência para um equilíbrio com
taxas de inflação civilizadas, lenta.
Tudo isso era agravado por um déficit em conta corrente superior a 3%
do PIB, que trazia sérios riscos de inflação de demanda, além de uma situação de liquidez internacional bastante apertada. Na época, a taxa de
risco Brasil estava acima dos 900
pontos e o país pagava, em dólares, juros ("yields") de 15,5% por sua dívida
externa soberana. "Yields" tão elevados impunham forte limitação sobre
o quanto a Selic poderia ceder sem
que uma bolha especulativa explodisse no mercado de câmbio. Nada mais
apropriado, portanto, que as metas de
inflação refletissem tal realidade.
Bem, estamos em 2007 e o Conselho Monetário Nacional se reunirá
para determinar a meta de inflação
para 2009. A realidade atual não podia ser mais diferente que a de antes.
Hoje em dia, não só o passado hiperinflacionário do Brasil é uma memória distante como também o choque a
ser absorvido é o de uma forte apreciação cambial -não desvalorização.
Além disso, o déficit em conta corrente se transformou em um superávit
de 1,6% do PIB -indicando que a
oferta agregada é consideravelmente
superior à demanda doméstica.
Ou seja, não há condições para um
cenário de inflação elevada, e as toadas tradicionais prevendo riscos de
inflação de demanda soam bastante
prematuras, se não equivocadas.
Mais importante, a situação de liquidez internacional é hoje amplamente favorável. A taxa de risco Brasil
está em 140 pontos e, com os juros
globais em patamares historicamente
baixos, os "yields" da dívida externa
soberana brasileira caíram para seu
mínimo histórico: 6,5%. "Yields" tão
baixos são compatíveis com uma forte redução na taxa Selic -para menos
de 10%- sem riscos de uma bolha especulativa explodir no mercado de
câmbio. Boas notícias, não?
Mas a meta de inflação para 2007
permanece em 4,5%, superior àquela
inicialmente fixada para 2001, e o argumento para mantê-la em 4,5% em
2009 é bastante curioso: como o Banco Central é muito ortodoxo, qualquer diminuição da meta de inflação
reduziria o ritmo de quedas na Selic,
colocando em risco o crescimento
econômico. Seria isso verdade?
Só no que diz respeito à ortodoxia
do BC- que é ortodoxo a ponto de
deixar qualquer presidente de Banco
Central alemão roxo de inveja. Quanto ao fato de uma meta mais baixa reduzir o ritmo de queda dos juros e
prejudicar o crescimento da economia, esse é um argumento que não
mais se aplica ao Brasil atual.
Afinal, cortesia da globalização, o
Brasil caminha inexoravelmente para
um equilíbrio com taxas de juros reais
inferiores a 5,5%, um crescimento
econômico de 5% e uma inflação muito próxima da internacional.
Essa é a realidade de uma economia
global com taxas de juros reais extremamente baixas e pressões deflacionárias vindas da China. Essa é também uma realidade que recentemente forçou, por meio da apreciação
cambial, o BC a retomar as quedas de
50 pontos base na taxa Selic, que havia abandonado em janeiro -independentemente da meta de inflação
ou de seu conservadorismo.
Logo, ao menos dessa vez, o CMN
pode se abster do debate desenvolvimentista-monetarista sobre se inflação causa ou não crescimento (não) e
sobre o papel do BC na determinação
das taxas de juros reais de equilíbrio
(quase nulo). Basta reconhecer a realidade e reduzir a meta de inflação de
2009 para menos de 4% -sem riscos
de diminuir o ciclo de quedas na Selic
ou prejudicar o crescimento.
PAULO TENANI é chefe de pesquisa para a América Latina do UBS Pactual Wealth Management e professor de finanças internacionais da Fundação Getúlio Vargas.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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