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TENDÊNCIAS/DEBATES
O "dossiêgate" frustra a proposta de Lula de fazer
uma concertação num eventual 2º mandato?
NÃO
Concertação ou confrontação
JEFFERSON PÉRES
O CLIMA da campanha eleitoral
parece evidenciar, mais do que
nunca, a necessidade de se
promover, após as eleições, um grande entendimento político em torno
de um projeto nacional de longo prazo, a ter início no próximo governo.
Se for verdade que, para nós, emergentes, o tempo histórico se encurta
dramaticamente, torna-se imperioso
remover, já no próximo quadriênio,
os obstáculos que impedem ou dificultam a nossa arrancada.
Não vejo como essa limpeza de terreno possa vir a ser feita sem uma
concertação entre alguns dos partidos que sobreviverem à cláusula de
barreira, sem o que não será possível
aprovar no Congresso medidas relevantes e imprescindíveis à retomada
do desenvolvimento.
Que fique claro: a concertação se faria sem adesismo, em torno de uma
agenda mínima, com os partidos de
oposição pactuantes fora do governo
e exercendo seu papel crítico.
Não falo só de reformas estruturais,
imprescindíveis, que não serão aprovadas sem consenso. Além dessas, há
duas outras, urgentes, que o próximo
governo terá de fazer aprovar pelo
Congresso já em 2007, sob pena de se
inviabilizar a partir de 2008.
Refiro-me à prorrogação da DRU e
da Cofins, que vencem em dezembro
de 2007. São emendas à Constituição,
e exigem, portanto, quórum qualificado de três quintos nas duas Casas, o
que nenhum governo terá, com toda
certeza. Ainda mais sem mensalão.
Mesmo vencidas essas primeiras e
decisivas batalhas, apenas se terá assegurado a continuação do precário
equilíbrio das contas públicas, suficiente para que o governo tenha uma
sobrevivência medíocre. Mas todos
concordam que o Brasil não pode
continuar nessa mediocridade. Vencida a inflação, o próximo governo terá de priorizar a retomada do crescimento, ao ritmo de pelo menos 5% ao
ano. Não como um fim em si mesmo,
mas como condição necessária para a
solução dos graves problemas do país.
Também parece consensual que se
torna inadiável a realização de um
ajuste fiscal profundo, tanto do lado
das receitas quanto do lado dos gastos, para dar equilíbrio consistente e
duradouro às contas públicas, como
precondição para a retomada do crescimento sustentável. Tal ajuste exige
mudanças na Constituição e nas leis
que dificilmente serão aprovadas sem
um acordo no Congresso. Até porque,
pela impopularidade de algumas dessas medidas, a oposição terá o reforço
de defecções na base governista.
Ante o quadro acima descrito, resta
ver que cenário se delineia para o próximo quadriênio. Supondo o mais
provável, que é a reeleição de Lula,
passaremos a respirar uma atmosfera
política carregada e envenenada, com
tempestades em seu bojo.
De um lado, teremos um presidente inebriado pela vitória, triunfalista e
arrogante, com desprezo crescente
pelos partidos e pelos políticos, tendente a deles prescindir em razão do
grande apoio popular.
Do outro, teremos uma oposição
machucada pela derrota, mas animada e tonificada pela real perspectiva
de vitória em 2010. Por isso mesmo,
aguerrida, intransigente e disposta a
tudo fazer para infernizar o governo.
Nessas condições, o presidente,
acuado e a sofrer sucessivas derrotas
parlamentares, será fortemente tentado a uma confrontação com o Congresso pela mobilização do povo para
manifestações nas ruas e nas urnas,
mediante convocação de plebiscitos.
Seria uma aplicação aqui do chavismo. Sem dúvida, um formidável equívoco, com poucas chances de êxito,
considerando as estruturas econômicas e sociais do Brasil, muito mais
complexas que as da Venezuela. Mas,
apesar do malogro, capaz de fazer um
grande estrago ao provocar a conjugação explosiva de uma dupla crise
-política e econômica-, que nos faria mergulhar no pior dos mundos.
A pergunta é: tem saída? Acho que
sim. Vejo o Brasil numa encruzilhada,
com o rumo a ser definido no próximo quadriênio. Se optarmos pela
concertação, iniciaremos a caminhada da lucidez, que nos levará, em poucos anos, a fazer parte da elite mundial. Se preferirmos a confrontação,
prosseguiremos nessa marcha da insensatez, conduzida pelos que não
souberam enxergar e, por isso, nos fizeram perder o bonde da história.
JEFFERSON PÉRES, 74, advogado, é senador da República pelo PDT do Amazonas.
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