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GABRIELA WOLTHERS
Democracia ou omissão?
RIO DE JANEIRO - A trajetória do menino Walace de Souza, que morreu aos 11 anos com um tiro nas costas disparado por um policial, mostra
como é longo o caminho que o Brasil
ainda tem que percorrer para ganhar
o direito de dizer que a infância é minimamente protegida no país.
Antes mesmo de sofrer a covarde
violência policial, Walace já era vítima de uma família desestruturada e
de uma sociedade que vê a tragédia
sendo escrita dia após dia sem esboçar reação para tentar impedi-la.
A mãe de Walace, Sandra, nem sabe quantos anos tem. Na quarta-feira, disse que tinha 42. Ontem, já dizia
que eram 35. Ao mesmo tempo, afirma que teve o primeiro filho aos 14 e
que ele tem hoje 19 anos. Pelas contas, pode também ter 33. A noção de
tempo não importa para quem é
obrigado a centrar todas as forças
apenas para sobreviver diariamente.
Sandra teve dois maridos. O primeiro ela largou porque bebia demais. O segundo batia nas crianças e,
desta vez, foram os filhos que largaram a família para viver nas ruas. Ao
todo, teve nove filhos. A maioria chegou a frequentar alguma vez a escola,
mas ninguém da família consegue
lembrar por quantos anos Walace estudou. Dizem que ele sabia escrever,
mas não têm lá muita certeza. A mãe
nunca teve emprego fixo. Os filhos
vendem balas nas ruas. Todos vivem
embaixo dos Arcos da Lapa há anos.
O Estado e a sociedade passaram
algumas vezes pela vida de Sandra.
Ela já foi encaminhada a abrigos e a
instituições privadas, mas nunca ficou por muito tempo. Foi atendida
por assistentes sociais, mas nada que
tenha mudado o rumo da família.
Seus filhos vão crescendo sem nenhuma perspectiva de futuro. Leis até
existem, mas, na maioria das vezes, o
Estado alega que não pode interferir
sem o consentimento da família. Será
que democracia significa deixar esse
e outros milhares de barcos correrem
-e afundarem- sem uma ação
mais efetiva do poder público?
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