São Paulo, sábado, 24 de janeiro de 2004

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PAINEL DO LEITOR

Privatização
"Na edição de 18/1, a Folha publicou a reportagem "Governo injeta US$ 15,6 bi em privatizadas", de autoria de Otávio Cabral e Leonardo Souza. O texto, que se vale de dados fornecidos pelo BNDES como fonte primária, aponta a Embraer como a principal tomadora de financiamentos por parte do BNDES de 1995 até o presente. Trata-se, no mínimo, de uma importante distorção de conceitos e fatos e, publicada da forma e no contexto da dita reportagem, resulta muito danosa à imagem da Embraer. Passemos aos fatos: 1) O único financiamento do BNDES concedido à Embraer (ou "injetado", para usar expressão utilizada pelos dois jornalistas) data de 1995, quando foi aprovado empréstimo no valor de US$ 126 milhões para o programa de desenvolvimento do avião de 50 lugares, ERJ-145, e para o qual a Embraer forneceu garantias reais equivalentes a 160% do montante envolvido. Desse valor, cujas parcelas foram sempre pagas rigorosamente em dia, restam hoje cerca de US$ 19 milhões de saldo devedor. De outra parte, de 1995 até a presente data, os investimentos da Embraer em novos produtos e em melhoria de processos totalizam cerca de US$ 1,7 bilhão. O investimento necessário para o desenvolvimento da família Embraer 170/190, estimado em US$ 1 bilhão, está sendo pago com geração de caixa, com venda de ações e com investimentos de risco de nossos parceiros industriais, sem o concurso de um centavo sequer de recursos públicos portanto; 2) O valor de US$ 4,152 bilhões -alocado à Embraer segundo indica o gráfico "O dinheiro do BNDES nas empresas privatizadas'- não teve a Embraer como beneficiada: trata-se, na verdade, de valor destinado ao financiamento de suas exportações, em que os tomadores são companhias aéreas internacionais clientes da Embraer. Ao financiar a exportação de bens de capital de base tecnológica de elevado valor, como é o caso de aviões, o BNDES cumpre o seu papel como agência de crédito de exportações do Brasil, apoiando uma indústria que, desde 1997, gerou mais de 9.000 empregos e, nos últimos nove anos, exportou quase US$ 14 bilhões, contribuindo para a balança de comércio do país em cerca de US$ 5,5 bilhões, efetivamente transferindo riqueza de fora para dentro do Brasil e propiciando desenvolvimento econômico e bem-estar social. 3) Cumpre salientar que, do total de quase US$ 14 bilhões exportados pela Embraer no período pós-privatização, uma parcela de US$ 7,8 bilhões (US$ 4,152 bilhões no período de 1992 a 2003, segundo a reportagem da Folha) teve origem em financiamentos concedidos pelo BNDES. Isso atesta que a Embraer sempre se preocupou em identificar no mercado fontes alternativas de financiamento -que responderam por US$ 6,2 bilhões- de modo a não depender exclusivamente do BNDES. O peso relativo de financiamentos concedidos por instituições financeiras internacionais às exportações da Embraer até 2001 correspondia a 56% de suas operações de exportação, entretanto sofreu um duro abalo com os atentados às torres de Nova York. As linhas aéreas foram as principais atingidas pela crise econômica que se instalou em todo o mundo e passaram, de uma hora para outra, a serem percebidas como risco, gerando um afastamento por parte dos investidores e financiadores. Diante de tal cenário, o papel desempenhado pelas agências oficiais de crédito à exportação, que no Brasil é exercido pelo BNDES, compreensivelmente passou a adquirir relevância ainda maior, dado que nesse período transitório, em que as instituições financeiras internacionais privadas estão retraídas e temerosas de investir, elas passaram a constituir as únicas grandes fontes de crédito de longo prazo para as indústrias de seus países; 4) Na reportagem publicada pela Folha, são mencionadas empresas privatizadas que receberam, como é de público conhecimento, financiamentos para investimentos em infra-estrutura, desenvolvimento de negócios ou mesmo reestruturação de dívidas. Ao efetuar tais referências, sem a necessária distinção entre os casos dessas empresas e o da Embraer, os autores da reportagem dão a seus leitores uma interpretação equivocada sobre tão delicada questão."
Maurício N. Botelho, diretor-presidente da Embraer -Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. (São José dos Campos, SP)

Ministérios
"A reportagem "Cristovam está na lista de cortes, diz Lula a novatos" (Brasil, pág. A5, 22/1) registra versão de diálogo entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o deputado federal Eduardo Campos que necessita de imediata retificação: 1. O diálogo, nos termos registrados, nunca existiu; 2. O presidente e o deputado limitaram-se a analisar a situação do Ministério da Ciência e Tecnologia, para o qual o deputado foi na oportunidade convidado pelo presidente, e a fazer comentários sobre o trabalho do Congresso em 2003. Em nenhum momento tratou-se do ministro Cristovam Buarque ou do Ministério da Educação; 3. É da prática política do deputado Eduardo Campos nunca trazer a público conversas de caráter reservado, a não ser quando houver acordo nesse sentido com seu interlocutor. Não contrariou essa orientação na audiência com o presidente da República."
Vera Confran, assessora de imprensa do deputado Eduardo Campos (Brasília, DF)

Resposta do jornalista Kennedy Alencar - O ministro abriu exceção à sua "prática política" anteontem ao relatar em detalhes a colegas do Congresso as palavras do presidente tais quais registradas pela Folha.

Bandeirantes, imigrantes...
"Quem acompanha pelas emissoras de TV os eventos oficiais comemorativos dos 450 anos de São Paulo não desconfiará de que esta cidade contou e conta com uma participação significativa e expressiva da população negra. Tudo se passa como se apenas bandeirantes e imigrantes fizessem parte desta história. O projeto para dar uma feição européia a São Paulo data do século 19, quando os negros foram expulsos do centro para as periferias. Nenhum vestígio da sua presença deveria permanecer. Em 1903, a área onde se localizava a primitiva igreja do Rosário dos Homens Pretos foi considerada de "utilidade pública", e a igreja foi demolida. O largo do Rosário dos Pretos, como era conhecido, passou a denominar-se praça Antônio Prado. A história oficial de São Paulo, da forma como tem sido apresentada e divulgada, ignorando essa parcela importante da população, não cumpre com o seu papel de educar, de informar e de formar. Serve apenas serve para alienar e cristalizar preconceitos e estereótipos."
Antonia Quintão Cezerilo, historiadora, professora-doutora, autora do livro "Irmandades Negras: outro espaço de luta e resistência - São Paulo: 1870-1890" (São Paulo, SP)

Governo novo, prática velha
"A Unafisco-SP (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal em São Paulo) manifesta sua posição de repúdio sobre o loteamento de cargos na Receita Federal (nota "Luz verde", "Painel", 22/1). Por seu posicionamento histórico, a Unafisco-SP opõe-se a qualquer indicação para cargos na Receita Federal que aconteça por outros meios que não os critérios técnicos. Por muitos anos, em especial no governo anterior, os servidores da Receita e a sociedade tiveram de ver esse órgão, personagem-chave no combate à sonegação e ao contrabando, ser comandado por tecnocratas descomprometidos com tais objetivos. Muito nos estranha que neste governo, que deveria ser "novo", essa velha prática esteja sendo empregada."
Narayan de Souza Duque, presidente da Unafisco-SP (São Paulo)

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