São Paulo, quarta-feira, 24 de março de 2004

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ANTONIO DELFIM NETTO

Juro real de "equilíbrio"

Um dos mais agressivos mitos contra o desenvolvimento econômico do Brasil é a opinião de alguns economistas que, por motivos físicos (e talvez metafísicos!), a taxa de juro real de "equilíbrio" (seja isso lá o que for) tem que ser alta: entre 8% e 10%! Em geral não apresentam nenhuma prova sobre o número. Apenas proposições apodícticas: "Sempre fomos péssimos devedores!"; "Temos uma história de calotes!"; "Não respeitamos contratos!" etc. Essas proposições contêm uma certa dose de verdade, mas são, evidentemente, exageradas como hipóteses para explicar a história financeira do Brasil. Qual o país que ao longo de sua história não violou uma vez ou outra seus contratos? O descumprimento de contrato sob o imperativo irresistível da realidade é presença ubíqua na história de todos os países, ainda que com freqüência diferente.
O século 20 apresenta dois momentos muito claros no que respeita ao fenômeno inflacionário, como se vê no gráfico abaixo, onde consta a inflação acumulada de EUA e Reino Unido.




Entre 1900 e 1974, a taxa de inflação geométrica dos EUA foi de 2,4% ao ano. Entre 1974 e 2001 ela praticamente dobrou, passando a 5,1%, o mesmo acontecendo em quase todos os países. A resposta a esse crescimento foi aumento da taxa de juro real média de 0,4% no período 1900-1980, para 2,8% no período 1980-2000. O mesmo aconteceu em todos os países, tendo a taxa de juro real passado da média de -0,7% entre 1900 e 1980 para 3,7% no período seguinte até 2000. A correção do processo inflacionário criado pelas políticas fiscal e monetária dos anos 70/80 foi longa e custosa, deixando como herança uma taxa de juro real que tem contido o crescimento das economias desde os anos 80.
O que diz a história dos países hoje desenvolvidos? Qual foi sua taxa de juro real durante o século 20? Num cuidadoso estudo, Elroy Dimson, Paul Marsh e Mike Staunton ("Triumph of the Optimists", 2002), da London Business School, calcularam a taxa real de juros deduzindo da taxa nominal dos bônus governamentais a taxa de inflação no período correspondente.
O resultado pode ser apreciado na tabela abaixo:




A pergunta não respondida é: por que a taxa de juro real de "equilíbrio" do Brasil há de ser duas vezes e meia a vivida pelo mundo entre 1980 e 2000? Entre 1900 e 1980 nossa taxa era bem mais próxima da média mundial, e nosso crescimento, muito mais vigoroso...

Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.
dep.delfimnetto@camara.gov.br


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