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FERNANDO GABEIRA
Battisti no Brasil
OS ANOS 60 voltam em dois
momentos. O primeiro deles foi a reportagem sobre o
livro "Bicicleta Branca", no "Herald Tribune". Seu autor, Joey
Boyd, foi um grande produtor musical no período. O título é uma referência à tentativa dos Provos, um
grupo de esquerda holandês, de dar
bicicletas a todos. Com o tempo, as
bicicletas brancas foram roubadas
e pintadas.
A prisão de Cesare Battisti no
Brasil é outra volta. Desta vez, não
só romântica como as bicicletas.
Na França, onde esteve asilado, o
caso Battisti é importante. Os três
principais candidatos à Presidência manifestaram-se sobre a prisão. O da direita comemorou, a da
esquerda esquivou-se, e o do centro, François Bayrou, assumiu a
posição digna: o direito europeu
garante o pleno direito de defesa.
Battisti inspirou dois livros. Um
de Fred Vargas, famosa escritora
de romances policiais, apontando
os erros do processo contra Battisti. E também um de Guillaume
Perrault, com o título "Geração
Battisti".
A tese de Perrault é a de que Battisti representa a consciência pesada da geração de 68, pois seu pesadelo, escapar pelo mundo, poderia
acontecer com qualquer um.
Acontece que Battisti foi agraciado pela doutrina Miterrand, que
aceitava os refugiados dos anos de
chumbo na Itália desde que renunciassem à violência. Miterrand não
é da geração de 68, nem estava movido por nenhuma culpa. Creio que
pensava em ajudar a Itália a superar uma fase tão conturbada.
Sem uma jurisprudência, tratando caso por caso, o Brasil vai no
mesmo sentido de Miterrand, pois
já aceitou três refugiados italianos
cujas extradições foram pedidas.
Hoje, vivem em harmonia na sociedade brasileira; de vez em quando,
visitam a família na Itália.
Existe uma clara diferença entre
a esquerda francesa e a italiana.
Perrault acha esta mais moderna,
pois rejeita qualquer tipo de romantismo com a luta armada e é
mais severa com Battisti. Mesmo
aqui, seus argumentos são fracos,
pois Bernard Henry-Levy, defensor de Battisti, e Bayrau não são de
esquerda.
Depois da prisão, virá um sereno
debate jurídico. Seus crimes foram
ou não políticos? Deve-se extraditar alguém condenado in absentia,
num período de leis especiais? É
possível dispensar o pleno direito
de defesa?
É um desafio para a Justiça brasileira: decidir sobre uma questão
que dividiu dois países durante
tanto tempo. Ela tem acúmulo teórico para dar resposta à altura. E
encerrar uma época.
assessoria@gabeira.com.br
FERNANDO GABEIRA escreve aos sábados nesta
coluna.
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