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Deficit constitucional
STF ameaça regulamentar aviso prévio proporcional previsto na Constituição de 1988; medida traria prejuízo econômico e para instituições
À primeira vista, o Supremo Tribunal Federal (STF) aproximou-se
demais de usurpar atribuição do
Congresso Nacional com a prometida regulamentação do aviso prévio na demissão de trabalhadores.
Não compete à Corte Constitucional ocupar-se de definir se demitidos fazem jus a um mês adicional de emprego (ou a ressarcimento equivalente) a cada três
anos trabalhados, ou seis, ou dez.
Parece evidente que tais detalhes estão e devem permanecer na
alçada do Legislativo. Na pior hipótese, poderiam ser regulados
por medida provisória, já que carradas delas são enviadas ao Congresso pelo Executivo. Ao STF se
reserva o controle da constitucionalidade das leis, não a formulação positiva de seu conteúdo.
No Brasil, contudo, freios e contrapesos entre os Poderes da República andam descalibrados, e
não é de hoje, nem de responsabilidade exclusiva de um deles. Todos concorrem para o tumulto legal que atravanca a vida dos particulares e o funcionamento de empresas, governos e tribunais.
É coletiva, e sinal de deficiência
institucional, a omissão que permite a um dispositivo constitucional permanecer 23 anos sem regulamentação nem aplicação. Se
fossem mais disseminados o hábito e a disciplina de atentar para o
texto constitucional, todos saberiam que seu artigo 7º prevê "aviso
prévio proporcional ao tempo de
serviço, sendo no mínimo de 30
dias, nos termos da lei".
O Supremo, portanto, apenas
reconheceu que o aviso prévio deve ser proporcional e apontou a
inexistência do dispositivo regulamentador. E não o fez de moto próprio, mas provocado por funcionários demitidos da Vale.
Os trabalhadores reivindicam
uma regra provisória para a proporcionalidade, enquanto durar a
omissão quanto ao regulamento
(a praxe de mercado é conceder só
o mínimo de 30 dias). O STF deveria limitar-se, contudo, a indicar
ao Congresso a obrigatoriedade
de regulamentar o artigo 7º.
A decisão final ainda não veio,
graças ao pedido de vista do relator, mas seria indesejável que o
Supremo a tomasse especificando
um critério para a proporcionalidade. Qualquer dia a mais de aviso prévio implicará encarecimento da mão de obra, o oposto do que
necessita a economia nacional, já
cumulada com regras que enrijecem o mercado de trabalho.
O episódio explicita, ainda, a
questão mais geral dos dispositivos que aguardam regulamentação desde 1988.
O ativismo do STF, por vezes benéfico, só encontrará um limite
natural quando os três Poderes se
coordenarem para identificar todas as pendências e iniciarem um
mutirão para reduzir esse escandaloso deficit constitucional.
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