São Paulo, Sábado, 24 de Julho de 1999
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A política social do governo FHC tem sido eficaz no combate à pobreza?

NÃO
Cesta básica ou renda mínima?

EDUARDO SUPLICY

O presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou, no início do mês: "Não podemos continuar a ter programas de cestas básicas indefinidamente, porque isso é uma indignidade". Curiosa declaração. Seu governo multiplicou por dez a distribuição de cestas básicas: de 3.102.526, em 1995, para 29.803.034, em 1998!
É um exemplo da ineficiência da política social do governo. Há muito tempo os especialistas em política social sabem que a distribuição de cestas básicas constitui um mecanismo problemático de assistência. A compra centralizada de bens pelo governo é, com frequência, fonte de desperdícios, dificuldades de transporte e abusos.
Haverá melhor alternativa? Sem dúvida. E ela vem sendo praticada, com sucesso, em um número crescente de municípios, sobretudo os governados pelo PT. O governo federal já poderia ter instituído em todo o território nacional um programa de garantia de renda mínima, de maneira a prover cada brasileiro de uma renda suficiente para as suas necessidades básicas. Assim, o governo estaria finalmente reconhecendo o direito inalienável de todos participarem da riqueza da nação.
O programa de renda mínima pode contribuir para criar mais empregos, garantir que as crianças estejam na escola, erradicar o trabalho infantil e a pobreza absoluta e melhorar a distribuição da renda.
Não é fácil, entretanto, convencer a elite brasileira da importância de atacar a miséria e a desigualdade. Todos prestam homenagem retórica a esses objetivos; poucos se dispõem a realmente lutar por eles.
Quando o presidente Fernando Henrique articulou a aprovação da lei 9.533, de 10 de dezembro de 1997, que autoriza o governo federal a financiar em 50% os programas municipais de renda mínima associados à educação, sua equipe optou por um formato muito restrito. A menos que o desenho do benefício venha a ser substancialmente modificado, a lei não terá efeitos importantes.
Entretanto, a despeito do pouco empenho do governo federal, mais de 30 municípios estão desenvolvendo programas de renda mínima ou bolsa-escola, por conta própria, com desenhos mais generosos.
O governador Anthony Garotinho (PDT), do Rio de Janeiro, iniciou o seu programa de bolsa-escola em 20 de julho, dando um salário mínimo às famílias que tenham renda inferior a meio salário mínimo "per capita" e cujas crianças entre 7 e 14 anos estejam frequentando a escola. O programa, que segue o desenho adotado no Distrito Federal, está sendo lançado experimentalmente, para mil famílias.
Mais adequada é a lei que está promulgada desde maio último no município de São Paulo e aguarda a regulamentação pelo prefeito Celso Pitta. Ela estabelece que toda família com renda mensal inferior a três salários mínimos (R$ 408), com crianças até 14 anos frequentando escola ou creche públicas e residente em São Paulo há pelo menos quatro anos terá direito a 33% da diferença entre R$ 408 e a sua renda. Na regulamentação que propus ao prefeito, ficaria estabelecido que a alíquota aumentaria para 45% se a renda da família fosse positiva, reforçando o estímulo à busca de trabalho.
Segundo estimativa da Fundação Seade, a lei beneficiará aproximadamente 215 mil famílias, o que corresponde a 860 mil pessoas ou 8,5% da população paulistana.
Será que vamos ter de esperar a eleição de Marta Suplicy para ver a lei regulamentada e posta em prática?


Eduardo Matarazzo Suplicy, 58, senador pelo PT de São Paulo, é doutor em economia pela Universidade Estadual de Michigan (EUA) e professor de economia da Fundação Getúlio Vargas (SP).



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