São Paulo, domingo, 24 de outubro de 2004

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ELEIÇÕES NO IMPÉRIO

Dentro de pouco mais de uma semana, os norte-americanos escolherão seu próximo presidente. Trata-se de uma das mais disputadas e polarizadas eleições da história recente dos Estados Unidos. Nunca se gastou tanto nas campanhas. Nunca o mundo esteve tão atento à escolha de um presidente. Nunca uma eleição pareceu tão importante.
Em algum sentido, o pleito é um referendo sobre o governo do candidato à reeleição George W. Bush, um dos mais controversos políticos que já ocuparam a Casa Branca. Bush viu-se em meio a polêmicas bem antes de assumir o cargo, no conturbado processo eleitoral de 2000, em que a escolha do líder dos EUA foi decidida não nas urnas, mas pelos juízes da Suprema Corte.
Analistas apostavam que, carecendo de uma legitimidade popular mais sólida e clara, o escolhido procuraria conduzir um governo de união nacional, renunciando a suas inclinações mais extremadas em favor de posições mais ao centro. Não houve tempo para tanto. No dia 11 de setembro de 2001, criminosos da rede Al Qaeda desferiram o mais violento ataque terrorista contra os EUA em toda a sua história.
Bush, de cuja capacidade de liderar muitos então duvidavam, declarou guerra ao terrorismo e engajou-se na campanha do Afeganistão. Foi capaz de depor a milícia radical do Taleban, que dava apoio aberto à Al Qaeda, e seus índices de popularidade aproximaram-se de 90%.
O presidente, no entanto, não se satisfez e decidiu lançar-se contra o Iraque de Saddam Hussein. Com a alegação de que o ditador ocultava armas de destruição em massa, Bush rompeu com antigos e valiosos aliados, atropelou o sistema de segurança criado pelos próprios EUA após a 2ª Guerra Mundial e adotou o mais obstinado unilateralismo.
Derrubou Saddam Hussein, mas, tendo avaliado mal o cenário do pós-guerra, enredou suas forças num atoleiro do qual agora não consegue sair. Pior, viu ruir uma a uma todas as razões que pretextou para a operação militar. Investigações conduzidas pelos próprios EUA demonstraram que Saddam não possuía armas de destruição em massa e que não representava uma ameaça iminente nem para os EUA nem para seus vizinhos próximos. Esclareceu-se também que não existiam vínculos entre Bagdá e a Al Qaeda. Mesmo a idéia de que Bush havia poupado o planeta de um tirano particularmente cruel foi arranhada pela divulgação de imagens de soldados americanos submetendo prisioneiros iraquianos sob sua custódia a maus-tratos.
Em meio a essa barafunda, Bush encontrou formas de beneficiar com contratos de reconstrução no Iraque empresários ligados à Casa Branca.
Surpreendentemente, porém, o presidente resistiu bem a todos esses reveses externos e, mesmo sem realizações domésticas particularmente notáveis, tem-se mostrado capaz de dividir o eleitorado.
Seu oponente, o senador democrata John Kerry, é uma incógnita. Procura mostrar-se moderado e esforça-se para parecer um guardião confiável da segurança dos norte-americanos. Se eleito, suas ações estarão em grande parte comprometidas pelo cenário criado por Bush, mas suas críticas ao unilateralismo parecem fazer dele uma opção menos traumática e mais promissora para a evolução das relações internacionais.


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