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São Paulo, quarta-feira, 24 de dezembro de 2003

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VALDO CRUZ

E o nosso, Lula Noel?

Véspera de Natal, poderíamos dizer que Papai Noel foi generoso com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O petista recebeu presentes valiosos neste seu primeiro ano de governo. Tantos que esbanjava felicidade nos últimos dias.
Da população, ganhou talvez o mais importante deles: a compreensão num ano de crise aguda na economia. Mesmo com desemprego elevado e crescimento quase zero -se não for zero-, Lula termina o ano com elevados índices de aprovação.
Do mercado financeiro e do Fundo Monetário Internacional, recebeu o reconhecimento de aluno bem-comportado, nota dez, ao promover um severo ajuste na economia, com juros altos e gastos reprimidos. Resultado: foi restaurada a credibilidade externa brasileira.
Do Congresso, levou uma safra de regalos. No finalzinho do ano, os senadores entregaram ao presidente aprovadas as reformas da Previdência e a tributária. A segunda garantiu-lhe poder continuar cobrando a CPMF, o chamado imposto do cheque, até o final do mandato. Um presentão.
Não foi só. Deputados e senadores foram bastante generosos. Outros mimos foram concedidos a Lula. Entre eles, a prorrogação da alíquota de 27,5% do Imposto de Renda da Pessoa Física e a nova Cofins, duas medidas que vão engordar o caixa do Tesouro Nacional.
Pela lista acima, Lula tem motivos de sobra para comemorar. Ganhou muito num ano de tanta escassez. Distribuiu, porém, muito, mas muito pouco para um país tão carente. Quase nada. Faltou a contrapartida para os brasileiros, que, em sua grande maioria, não tiveram a mesma sorte presidencial.
O Lula Noel acabou não dando as caras neste ano. Parece ter esquecido seu trenó em algum canto do Palácio da Alvorada. Até que o petista andou prometendo um Natal gordo aos brasileiros. Anunciou um espetáculo do crescimento que não veio. Ensaiou um programa social que patinou o ano inteiro. Viu o desemprego subir e a renda do trabalhador cair, em média, cerca de 10%. Sem falar num ministério que mais bateu cabeça do que serviu ao país.
Por onde passa, Lula costuma dizer que a responsabilidade é do antigo morador do Alvorada. Um tucano que teria deixado o trenó num estado lastimável, totalmente quebrado. Não dava para alçar vôo além do gramado da residência presidencial.
É uma desculpa. Batida, mas é uma desculpa. O brasileiro médio parece ter acreditado. Está resignado, com certeza. Mas não tão feliz como o presidente nos últimos dias. É que o brasileiro não tem tantos motivos para comemorar. Se é que tem algum.
No ano que vem, o que o brasileiro espera é que o Lula Noel, enfim, mostre serviço. Será o ano da verdade do PT. Afinal, ele terá tido tempo suficiente para reparar os defeitos do trenó presidencial. Caso contrário, as pressões, abafadas em 2003, podem explodir em 2004. Mais um Natal de privações, ninguém vai querer.
No Palácio do Planalto, o discurso é que esse risco Lula não corre. O próximo ano poderá não ser o dos sonhos do presidente, mas será melhor do que este. É o que dizem.
De onde vem tanta segurança? Alardeiam os petistas que é exatamente da pindaíba desse ano. Lula decidiu fazer sacrifícios no primeiro ano e pensar no longo prazo. Tudo bem. Só que os maiores sacrificados foram os brasileiros. Um próximo Natal magro ninguém vai suportar.


Valdo Cruz é diretor-executivo da Sucursal de Brasília. Hoje, excepcionalmente, não é publicado o artigo de Delfim Netto, que escreve nesta coluna às quartas-feiras.


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