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CARLOS HEITOR CONY
Duas estátuas
RIO DE JANEIRO - Eram dois mineiros, um de Itabira, outro de Ubá.
Tanto fizeram que, além de morrer,
transformaram-se em estátuas de
bronze e estão na praia de Copacabana, um deles no Posto Seis, onde morava, outro no Leme, onde também
morava.
Na semana passada, foi inaugurada a estátua de Ary Barroso, lembrando um pouco a de Fernando Pessoa, em Lisboa, sentado diante da
mesa de um bar. A outra estátua é
mais antiga e mais feliz. É a do poeta
Carlos Drummond de Andrade num
banco, com aquela cabeça baixa que
ele mesmo se atribuiu em poema famoso.
Reparei nas duas estátuas. Vistas
de longe, e com boa vontade, dão a
impressão de que eles ali estão realmente. Fui vizinho de Drummond no
Posto Seis, ele morando na rua Conde Lafayete, eu, na Raul Pompéia.
Nunca o vi sentado num banco daqueles. Não gostava de ser reconhecido e jamais ficaria dando sopa a chatos que perturbam a vida dos outros.
Mas, se tivesse de escolher um lugar
para viver a eternidade do bronze do
qual é feito, certamente aprovaria o
banco, embora sugerisse que ficasse
olhando para o mar, e não para o
complicado trânsito da Atlântica.
Ary era diferente. Quando estava
sóbrio, gostava de ficar sozinho. Várias vezes o vi comendo numa mesa
afastada, na mesma cantina que
agora abriga a sua estátua. Mas,
quando ficava alegre um pouco além
da conta, gostava de ir de mesa em
mesa, falando com todo mundo,
brincando com os conhecidos, ficando íntimo dos desconhecidos.
Copacabana decaiu como bairro
residencial. A praia continua bela,
mas suas gentes migraram para Ipanema, Leblon e Barra. Drummond e
Ary, ali plantados, falam de uma Copacabana que não existe mais, a Copacabana dos anos 50 e 60, quando
se podia esbarrar nas ruas com um
poeta como Drummond e com um
compositor como Ary. No mesmo
Posto Seis morava Guimarães Rosa
(outro mineiro) e, no Leme, bem pertinho de Ary, a doce e enigmática
Clarice Lispector. Sim, era uma outra
Copacabana.
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