São Paulo, quinta-feira, 25 de março de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

Câmara ardente

BRASÍLIA - José Dirceu tem uma densa história de vida, o comando do PT e boa capacidade de arregimentação e de articulação. O problema não É ele, mas ESTÁ nele. Com Dirceu no Planalto, a crise está no Planalto.
Brasília já viu esse filme mil vezes. O ministro ou assessor de primeiro time entra no alvo, fica dias, semanas, meses tentando escapar do tiroteio até tombar. Adiar a queda só piora as coisas -para o réu ou vítima (depende do caso) e para o governo.
A crise que era Waldomiro e virou Dirceu piora ainda mais a péssima gestão de governo, atiça o fisiologismo da base aliada, concentra as atenções da mídia e fatalmente chega aos mercados. Ontem, a Bolsa baixou, o dólar subiu. O de sempre.
A queda costuma corresponder à personalidade de quem cai. Um fica depressivo, outro, agressivo, vários saem atirando. Dirceu atira a ermo, e os seus miram a política de Palocci. O tiroteio contra um ministro virou fogo cruzado contra o pilar do governo.
Lula tem bons motivos para questionar se é melhor manter ou tirar Dirceu, mas o próprio Dirceu vai acabar percebendo que só está adiando a agonia. Teve chance de sair por cima no início, se explicar e voltar. Pôde, depois, manter sob controle a crise, a base e o PT. Tudo o que tem feito, porém, é o contrário disso: ficou, acusou, acirrou, até perder as estribeiras e passar a atacar inclusive os aliados em potencial na crise.
Em minutos, numa entrevista, Dirceu botou em guarda os governadores do PSDB que Lula acabara de bajular com viagens, jantares e sorrisos. De quebra, botou o Ministério Público em posição de ataque. Errou. Waldomiros e Burattis andam soltos por aí. Nunca se sabe quando e o quanto o governo e o próprio Dirceu vão precisar dos procuradores.
Enquanto ele se debate, já se discute abertamente quem poderia ser o sucessor na Casa Civil. E aí começa um outro problema: com os quadros que tem na Câmara, no Senado e no próprio governo, quem o PT tem à mão para substituir o poderoso Dirceu? É dramático.


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