São Paulo, Domingo, 25 de Abril de 1999
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TENDÊNCIAS/DEBATES
Diretas-Já: 15 anos hoje



Como há 15 anos, o Brasil pode se unir em torno de objetivos comuns, preservando a pluralidade de idéias
DANTE DE OLIVEIRA

Não há como esconder minha forte emoção quando, neste 25 de abril, comemoramos 15 anos da memorável campanha pelo restabelecimento da democracia e das eleições diretas para presidente da República no Brasil, marcada por uma mobilização popular poucas vezes vista e pela votação no Congresso, em 1984, da emenda que levava meu nome. Foi o maior movimento cívico da história deste país.
O desejo de reconquistar a cidadania plena e o direito democrático de eleger o mais alto dirigente do país, ambos cerceados pelo autoritarismo do regime militar, levou o povo às ruas. No início desacreditada, inclusive por importantes partidos e lideranças, a campanha das Diretas-Já tocou fundo o coração dos brasileiros. Arrastou às praças públicas jovens, idosos, homens, mulheres, trabalhadores, profissionais liberais, empresários, militantes, representantes de toda a sociedade. Uniu nos mesmos palanques figuras de nossa história política como o saudoso jurista Sobral Pinto, um liberal, e João Amazonas, dirigente comunista e combatente da Resistência Francesa. A imprensa, que defendeu corajosamente a redemocratização e abraçou a campanha, foi de fundamental importância.
A capacidade de unir todos os brasileiros, sobrepondo-se a diferenças ideológicas e partidárias, e o caráter eminentemente pacífico foram duas características marcantes daquele movimento popular, que sacudiu o Brasil. A sociedade mostrou claramente que sabia o que queria e que não precisava usar de violência para reconquistar a democracia. Milhões de pessoas ocuparam as ruas das grandes cidades brasileiras, sempre de forma pacífica.
Hoje, olhando para trás, constatamos que, apesar da rejeição da emenda pelo Congresso, a campanha pelas eleições diretas mudou profundamente nossa história. Rompeu os ferrolhos da ditadura e abriu as portas da redemocratização do país, que nunca mais foi o mesmo. Tancredo Neves ainda foi eleito pelo Colégio Eleitoral, mas foi a primeira vitória da oposição após o golpe de 1964; as diretas para presidente foram apenas questão de tempo.
Não podemos, porém, nos contentar apenas com as conquistas no campo institucional ou com o lado até certo ponto romântico do exercício do voto. A democracia não se encerra nas liberdades democráticas. A luta do povo brasileiro hoje deve ser pela conquista da democracia econômica e social. A democratização da terra, da educação, da saúde, do saneamento, dos avanços tecnológicos, do emprego, do lazer e da cultura tem de ser um imperativo do Brasil moderno. Precisamos assegurar a todos as condições necessárias para viver com mais dignidade e pleno acesso a direitos sociais básicos.
Para avançarmos, o primeiro e mais importante passo é promover uma verdadeira revolução na área educacional. Só com uma educação de qualidade, acessível a todos os brasileiros, dos mais humildes aos mais privilegiados economicamente, poderemos nos inserir nos tempos modernos, no mundo da globalização econômica e cultural.
Sem ela, continuaremos eternamente "em desenvolvimento", um país do "Terceiro Mundo". Com os extraordinários avanços tecnológicos, que revolucionam os meios de produção, aproximam os indivíduos e os povos e tornam este planeta uma pequena aldeia, quem não dominar o conhecimento e a informação estará fadado ao subdesenvolvimento. O trabalhador que não se qualificar não conseguirá nem um emprego para sustentar sua família.
Como há 15 anos, o Brasil pode se unir de novo em torno de alguns objetivos estratégicos e comuns, preservando a pluralidade partidária e de idéias. Nada impede que partidos de todas as correntes ideológicas estabeleçam certas prioridades, bandeiras de luta que tenham por objetivo modernizar o Brasil, dando um salto de qualidade -coisa que não pode mais ser postergada. A educação tem de ser um grande pólo de unidade nacional.
Milhões de brasileiros continuam à margem dos avanços econômicos, tecnológicos e sociais. Boa parte ainda vive na miséria, passando pelas mais duras privações. Trata-se, antes de tudo, de uma questão ética. Não podemos continuar convivendo com essas disparidades sociais, que fazem do nosso país um dos mais injustos do mundo. A busca da igualdade social e econômica, por mais utópica que possa parecer, ainda é o motor que faz a humanidade caminhar em direção a um futuro no qual os homens vivam de forma mais fraterna, harmônica e feliz.
A luta não terminou. Os sonhos meus, do velho guerreiro Ulysses Guimarães, de Tancredo, Lula, Brizola, Barbosa Lima Sobrinho, Fernando Henrique Cardoso, Mário Covas, Teotonio Vilela e tantos outros ainda batem forte no coração dos brasileiros.

Dante de Oliveira, 47, é governador reeleito de Mato Grosso pelo PSDB. Foi prefeito de Cuiabá (1985-86 e 1993-96) e ministro da Reforma e do Desenvolvimento Agrário (governo Sarney). Em 1984, deputado federal pelo PMDB, foi autor da emenda das Diretas-Já.


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