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TENDÊNCIAS/DEBATES
Devem-se extinguir as CCPs?
NÃO
Eficiência, com ética e objetividade
LUIZ CARLOS DELBEN LEITE, ADILSON LUÍS SIGARINI e LUIZ MARINHO
A solução de conflitos na relação
entre capital e trabalho é uma das
principais tarefas das entidades representativas de trabalhadores e empresários. O conceito vale tanto no campo coletivo -negociação das convenções de
trabalho- como no individual. Porém,
desde os anos 40, os conflitos trabalhistas são remetidos à Justiça do Trabalho.
Mas, ao longo de todos esses anos, esse modelo de arbitragem tem se mostrado ineficaz. As cerca de mil varas do
Trabalho existentes no país estão abarrotadas por mais de 2 milhões de causas
trabalhistas movidas a cada ano -um
volume assombroso. Todos os tipos de
conflito são encaminhados a essas varas
e a demora é inevitável: as reclamações
levam cerca de dez anos para serem julgadas, trazendo toda a sorte de problemas tanto para reclamantes como para
reclamados. E muitos desses conflitos
poderiam ser resolvidos com rapidez
por outros instrumentos de arbitragem.
A discussão sobre essas alternativas,
inclusive a instituição da conciliação
pré-judicial, não é nova no Brasil. O
quase colapso da Justiça trabalhista, em
2000, resultou na lei 9.958/2000, que instituiu as Comissões de Conciliação Prévia. Desde então, inúmeras CCPs foram
implantadas. Mas, lamentavelmente,
muitas tiveram seus objetivos desvirtuados e se transformaram em casos de
polícia. Sem dúvida, essas denúncias
precisam ser apuradas com todo o rigor. Essas distorções, no entanto, não
podem resultar no desmantelamento
das CCPs como alternativa para construir formas modernas e eficientes de
mediação do conflito, capazes de romper com os limites impostos pela falência da Justiça do Trabalho.
Pelo contrário. As mazelas apontadas
devem servir para aprimorar ainda
mais as experiências já positivas das
CCPs. E elas são muitas. É o caso das comissões criadas a partir de convenções
coletivas firmadas pela Federação dos
Sindicatos de Metalúrgicos do Estado
de São Paulo (FEM/CUT) e dois grupos
empresariais do ramo: um que congrega todas as indústrias do grupo XIX-III
da Fiesp (máquinas, eletroeletrônicos e
material ferroviário, entre outras) e o de
autopeças, forjarias e indústrias de parafusos.
Os objetivos que nortearam a sua criação são claros: não são órgãos homologadores de rescisão contratual; em hipótese nenhuma permitem o aviltamento de direitos garantidos por legislação ou por convenções coletivas de
trabalho; não podem substituir o papel
dos sindicatos. Além disso, as CCPs desses setores metalúrgicos (duas no ABC e
uma em Sorocaba) não buscam firmar
acordos a qualquer preço e muito menos cobram taxas do reclamante.
Tampouco elas remuneram os conciliadores com base em percentuais sobre
acordos firmados. Mais ainda: em caso
de conciliação prévia de trabalhador demitido, o procedimento negocial só é
feito após a comprovação de que a sua
homologação já foi realizada e de que as
verbas rescisórias foram pagas. Em casos como este, são levadas às CCPs só as
ressalvas e controvérsias que não têm
relação com as verbas rescisórias ou direitos considerados garantidos.
As nossas comissões, portanto, são
fruto de uma relação madura e séria,
construída ao longo dos anos, entre trabalhadores e empresários, na qual a ética e a moralidade são conceitos consolidados e inatacáveis, mesmo considerando os interesses distintos que permeiam essa relação. Por isso, entendemos que as comissões que não seguem
esses princípios devem ser combatidas
com todo o rigor. Na verdade, elas se somam ao triste costume nacional de levar vantagens pessoais a qualquer custo, em detrimento de comportamentos
éticos e transparentes.
Na nossa opinião, não se pode nem se
deve cortar toda a árvore em função de
alguns de seus frutos haverem apodrecido, como sugeriu o ministro Francisco Fausto, ao propor a extinção de todas
as CCPs. Os exemplos do fechamento
da Sudam e da Sudene, por conta de
corrupção, são emblemáticos. Eles não
resultam, necessariamente, em moralidade na gestão dos interesses públicos.
Na verdade, a posição do presidente do
TST representa um retrocesso no processo de modernização das relações trabalhistas. Um retrocesso que está orientado pelo corporativismo do Judiciário,
que não quer admitir suas limitações e
sua incapacidade na distribuição da Justiça no mundo do trabalho.
Queremos seriedade e queremos continuar avançando nas relações entre trabalhadores e empresários, sem jogar
para baixo do tapete a sujeira que não
foi limpa por uns poucos que não compreendem que a ética, a verdade e a moralidade são os fundamentos para dirimir qualquer conflito. Para nós, as
CCPs são um passo adiante a fim de resolver os problemas da relação entre capital e trabalho dentro do próprio local
de trabalho, diminuindo o poder normativo da Justiça do Trabalho -enquanto não se pode acabar de vez com
ele-, um dos objetivos que norteiam
nossa ação na reforma sindical e trabalhista em curso no Fórum Nacional do
Trabalho.
A injustiça social herdada de nosso
passado oligárquico e autoritário tem
de ser vencida pela prática da negociação direta entre os atores sociais, que
não precisam da tutela do Estado para
estabelecer uma relação democrática na
sociedade brasileira.
Luiz Carlos Delben Leite, 58, é presidente do
Sindimaq (Sindicato Nacional da Indústria de
Máquina). Adilson Luís Sigarini, 48, é diretor
de relações trabalhistas do Sindipeças (Sindicato
Nacional das Indústrias de Autopeças). Luiz Marinho, 44, é presidente nacional da CUT (Central
Única dos Trabalhadores).
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