São Paulo, quarta-feira, 25 de dezembro de 2002

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ANTONIO DELFIM NETTO

Natal: entregando o prometido

Na semana passada, os brasileiros foram agradavelmente surpreendidos por três definições importantes feitas pelo governo que se instalará no dia 1º de janeiro. O presidente eleito, Lula, afirmou que 2003 será um ano de "aperto fiscal", com "cortes de despesas". Revelou uma intuição que a "ciência dos PhD's" não foi capaz de ver nos seus sofisticados modelos: a alternativa à alta de juros no combate à inflação (que corta a demanda do setor privado, aumenta o desemprego e empobrece o país) é o corte das despesas públicas (que reduz a demanda do governo).
Para realizar essa façanha, ao contrário de FHC, que preferiu elevar a carga tributária bruta de 27% para 35% do PIB com impostos da pior qualidade, o presidente eleito, Lula, deveria propor imediatamente ao Congresso a completa supressão dos impostos vinculados, juntamente com um dispositivo que torne o Orçamento de execução obrigatória. Disso resultarão duas coisas importantes:
1) obterá maior flexibilização para o corte das despesas; e 2) provará que não irá submeter o Legislativo à ignomínia do controle do Executivo por conta das emendas parlamentares.
O futuro ministro da Fazenda, Antonio Palocci, reafirmou que vamos continuar com um sistema de câmbio flutuante (que o governo não tem a pretensão de controlar porque sabe que é impossível), com um sistema de metas inflacionárias (realistas e que empenharão, inexoravelmente, o governo) e que vamos produzir o superávit dívida líquida/PIB, não na "boca do caixa", que transfere o problema, mas através de cortes efetivos combinados com o ministro do Planejamento. É, assim, uma grande incompreensão afirmar que o novo programa é simplesmente a "continuação" da política do poder incumbente que se despede...
Finalmente, tivemos o depoimento na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado do futuro presidente do Banco Central, senhor Henrique Meirelles, injustamente criticado pelo famoso "mercado" (que não tem sobrenome) por não ser um "operador de mesa". Ora, o que o presidente do BC precisa ser é apenas um administrador capaz de coordenar um grupo de sólidos especialistas (inclusive na famosa "mesa"), assessorado por uma forte e competente equipe técnica. O senhor Armínio Fraga foi exatamente isso. Na minha opinião, ele saiu-se relativamente bem diante do pavoroso quadro de choques de oferta adversos que enfrentou a partir da barbeiragem energética nacional e da deterioração da situação financeira internacional de 2001.
A boa notícia trazida pelo senhor Meirelles é que o governo Lula proporá a autonomia do Banco Central para que ele opere seu único instrumento, a taxa de juros nominal de curto prazo, para obter o precioso bem público que é a estabilidade do valor da moeda. Esta, que foi a marca da octaetéride fernandista, está se deteriorando no seu final. O Brasil terá suas "metas inflacionárias" definidas pelo governo e deverão ser atingidas pelo Banco Central. Os seus diretores terão mandato fixo condicionado à cláusula de sucesso, como ocorre em qualquer país civilizado.
Se o "companheiro" Lula continuar como até agora, cumprindo o que prometeu durante a campanha eleitoral, teremos na Presidência um verdadeiro estadista!


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.

dep.delfimnetto@camara.gov.br


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