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MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
Tortura brasileira
SÃO PAULO - Puritanos fardados e sem freios, liberados pelo estímulo
oficial ao uso de "métodos não-convencionais" para obter confissões,
comprazem-se com crueldades masoquistas e escatológicas na prisão que
simbolizava os horrores do regime de
Saddam Hussein. A alegria e a ausência de culpa é tamanha que tiram
fotos para guardar ou trocar com
seus pares. Americanos sinceros chocam-se e tratam a tortura como
"unAmerican" -algo essencialmente contrário ao espírito dos EUA.
Clóvis Rossi, o titular desta coluna,
já lembrou que essa é uma visão relativamente ingênua, uma vez que governos americanos foram useiros e
vezeiros em apoiar a prática de tortura em outros países. Em artigo publicado pela Folha no último domingo,
Frei Betto mostrava sua indignação
com as cenas de Abu Ghraib e dizia
que "quem passou pelos cárceres da
ditadura brasileira sabe que a Escola
das Américas formou torturadores
brasileiros e que a tortura sempre foi
admitida pela CIA".
Porém, em visita à China, Lula, de
quem Frei Betto é assessor especial,
tergiversa na questão dos direitos humanos. É certo que o Estado brasileiro assumiu nos últimos anos uma posição institucional clara de defesa
desses direitos, mas isso não serve para apagar o fato de que a tortura continua sendo aplicada em porões policiais por esse país afora.
Militantes do PT conhecem os males de um regime de arbítrio, embora
a democracia não seja um valor cultivado pela esquerda. Lula deveria
ter sido mais explícito na visita ao
shopping asiático. E os anfitriões poderiam lembrá-lo do assassinato de
um compatriota sob guarda da polícia brasileira, cujo crime seria sair do
Brasil portando, sem declarar, uma
quantia acima da permitida. Por isso
mesmo seria proveitoso que o tema
merecesse, também aqui, mais atenção do presidente e de seus assessores
- pois a tortura não é repugnante só
quando tem motivação política, é
praticada por americanos ou atinge
jovens radicais de classe média.
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