São Paulo, sexta-feira, 26 de maio de 2006

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Mais descrédito

É constrangedor uma CPI não ser capaz de extrair algo relevante de alguém como Delúbio, que tem muito a explicar

ANTEONTEM o Congresso Nacional simplesmente desistiu de investigar as denúncias sobre a máfia dos sanguessugas. A decisão torna sem efeito a sindicância da Câmara, em funcionamento há 15 dias, para apurar o caso e torna improvável a instalação de CPI para o mesmo efeito. Ontem o plenário da Casa livrou da cassação o deputado Vadão Gomes, o 11º "mensaleiro" a receber o aval de seus pares.
Se o objetivo dessas medidas é desmoralizar o Congresso, os parlamentares estão no caminho certo. Embora a experiência recente mostre que há muito mais a esperar de uma investigação empreendida pelo Ministério Público, é inaceitável que o Legislativo se recuse a investigar denúncias que envolvem nada menos que 283 congressistas.
Infelizmente, nem mesmo quando parecem dispostos a cumprir seu papel deputados e senadores apresentam melhor desempenho. Na terça-feira, a comissão que investiga irregularidades com os bingos e suas relações com campanhas eleitorais foi incapaz de extrair qualquer revelação importante do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares.
Delúbio negou a utilização de caixa dois na campanha eleitoral de 2002, refutou a existência de doações de campanha vindas de Cuba e poupou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de qualquer responsabilidade pelos ilícitos praticados pelo PT. O ex-tesoureiro desmentiu também as declarações do ex-dirigente do partido Silvio Pereira, segundo o qual o plano do partido era amealhar R$ 1 bilhão em parceria com Marcos Valério.
Chega a ser constrangedor que parlamentares, investidos de prerrogativas extraordinárias de investigação, sejam incapazes de extrair algo relevante de alguém como Delúbio, que obviamente tem muito a explicar. Nenhuma informação nova que ao menos pusesse a testemunha em contradição foi apurada pelos senadores. O tédio dominou a sessão.
Ontem, uma nova demonstração de inabilidade parlamentar foi transmitida ao vivo. Foi deprimente a acareação entre os advogados suspeitos de contribuir com o crime organizado, Sérgio Wesley da Cunha e Maria Cristina Rachado, e o técnico de som Arthur Vinícius Silva -que os acusa de ter comprado gravações de uma sessão secreta da CPI do Tráfico de Armas. A sessão, marcada por insultos, teve seu clímax na prisão teatral de Cunha, por desacato à comissão, após ter respondido com ironia acintosa a uma provocação também acintosa de um deputado.
CPIs não podem ser reduzidas a instrumentos de exibição eleitoral para deputados e senadores. Talvez seja ingênuo pedir mais compostura e eficiência na atuação dos congressistas, mas isso é o que seria necessário para restaurar a credibilidade da nobre função que exercem.


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