São Paulo, sábado, 26 de maio de 2007

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A Igreja e os índios

NESTA SEMANA, na praça São Pedro, o papa Bento 16 publicou a primeira "rectificatio" relativa a sua viagem ao Brasil. "As lembranças de um passado glorioso não podem ignorar as sombras que acompanharam o processo de evangelização do continente latino-americano", declarou. "De fato, não é possível esquecer o sofrimento e as injustiças impostas pelos colonizadores", acrescentou.
A emenda é bem-vinda. Em seu último discurso no Brasil, o papa cometera um erro historiográfico ao afirmar que "o anúncio de Jesus e do seu Evangelho não supôs, em qualquer momento, uma alienação das culturas pré-colombianas, nem foi uma imposição de cultura alheia".
Se há um ponto na história sobre o qual não pairam dúvidas é o de que o encontro das civilizações européia e ameríndia foi quase fatal para a segunda -física e espiritualmente.
Daí não se segue, como sugeriram Hugo Chávez e Evo Morales, que a colonização do continente não tenha passado de um "Holocausto mais grave que o da Segunda Guerra Mundial". Embora os resultados tenham sido trágicos, o empenho dos catequizadores não era apenas destrutivo. Ao contrário, há boas razões para acreditar que a maioria dos padres julgava fazer um bem aos índios ao convertê-los, ainda que sob forte constrangimento.
Mais do que isso, deve-se reconhecer que a colonização, da qual a igreja foi agente importante, encerra em si uma dialética entre destruição e progresso.
Quando duas culturas tão díspares se encontram, a mais vulnerável delas tende a sofrer violentas transformações -e isso é inevitável. A única alternativa é, a exemplo do que se faz hoje com as poucas comunidades aborígenes isoladas restantes, evitar qualquer contato. Mas mesmo essa opção não está livre de sérios dilemas morais.


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