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JOSÉ SARNEY
MST e transgênicos
O Brasil está como o criador o
fez e a geografia o consagrou. Sua
diversidade não é somente "bio", mas
política, cultural e surpreendente. Do
futebol ao samba, somos todos naturais.
Estamos, hoje, vivendo duas faces
dessa moeda, em temas sensíveis. Fabricamos de agulha a avião e lidamos
com temas que vão da Pré-História à
ficção científica. É o debate atual entre
o tempo de Aglau Sofídio, o mais pobre lavrador da Arcádia, que cultivava
um pequeno "enxido", e os alquimistas modernos, modificadores de genes e descobridores de genomas. Falo
dos sem-terra (MST), buscando a menor de todas as tecnologias agrícolas,
um pedaço de chão para plantar qualquer semente, chuchu, abóbora, chicória e -se pintar- feijão trepa-pau,
deliciosa leguminosa selvagem do
sertão do Maranhão. Na outra ponta,
a controvérsia sobre a soja transgênica com sua tecnologia de manipulação de genes.
Os dois lados, valendo-me de um
raciocínio do Veríssimo, são acusados de desobediência civil. O primeiro, de invadir terras alheias; os outros,
de plantios ilegais. Ambos são violadores da lei: uns plantam sementes
modificadas sem estudo de impacto
ambiental, outros promovem ocupações e desordem e comem bois do
próximo.
As invasões pularam de 103 para 184
apenas neste ano. Em fins de 2002,
eram 60 mil famílias em acampamentos, 200 mil no começo deste segundo
semestre de 2003.
Dizem que o objetivo é apressar a
reforma agrária, pressionando o governo com a ocupação de fazendas e
edifícios do Incra. A turma da soja
transgênica faz contrabando de sementes da Argentina, criando fato
consumado e o problema que arrancou lágrimas da ministra Marina.
Não me esqueço, quando se fala em
reforma agrária, de que, em 1985,
quando assumi a Presidência, essas
eram palavras malditas e identificadoras de subversivos e agitadores. O
ministério a ser criado era de Assuntos Fundiários. Quando recebi o ministro Nelson Ribeiro, convidado por
Tancredo Neves para o cargo, disse-lhe: "Vamos mudar o nome do ministério e dar-lhe o verdadeiro: da Reforma Agrária. Foi um deus-nos-acuda.
Se o problema era a reforma agrária,
daríamos nomes aos bois. O assunto
passou a ser tratado com seu real objetivo.
E agora os transgênicos? Uns afirmam que é modernidade, que vão aumentar a produtividade, vão dar ao
Brasil condição de não ficar atrás de
outros países produtores de soja. Os
contestadores afirmam o contrário. A
soja transgênica é um pacote tecnológico fechado, monopólio de uma
grande multinacional, para vender sementes e defensivos dela dependentes, tudo isso sem estudo de impacto
ambiental, necessário para afastar o
perigo e a vulnerabilidade da saúde
das pessoas e das espécies.
A verdade é que a batata quente caiu
na mão do José Alencar, o nosso simpático e competente vice, que não teve
outra saída senão pedir clemência e
dizer a todos, num estilo de bom mineiro: "Eu, um pobre coitado, presidente em exercício, lá das Gerais, ter
de assinar essa medida provisória! É
uma situação difícil. Vocês devem estar com pena de mim".
Realmente, ficar nesse fogo cruzado
não é nada bom. Mas pior está o Gugu
Liberato, apertado pelos seus personagens.
José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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